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12/06/2021 às 00h00min - Atualizada em 12/06/2021 às 00h00min

LUÍS, RESPEITA JANUÁRIO

CLEMENTE VIEGAS

CLEMENTE VIEGAS

O Doutor CLEMENTE VIEGAS é advogado, jornalista, cronista e... interpreta e questiona o social.

 
 
(Este tema foi criado para a crônica PÁGINA DE SAUDADE  (há 14 anos no ar) -  partícipe do Programa CLUBE DA SAUDADE - Rádio Mirante/AM, 08:00 hs., da manhã, há 32 anos no ar).

Naquele velho tempo, final dos anos 1960 recebi um convite para participar de um programa nas felizes tardes de domingo, na Rádio Educadora/AM. Era o programa PANORAMA ESTUDANTIL, do Grêmio Arariense dos estudantes. Jaime Pinto, Ribamar Muniz Pinto  Damansceno Pinto  e Eu-Viegas, compúnhamos o quarteto da apresentação do programa. De minha parte eu, opinava sobre trânsito, serviço público, dia a dia da cidade e ainda me aventurei em criticar sobre músicas (canções) que tocavam na época. Eu nunca entendi de música. Mas foi aí que despontou a Crítica, de CLEVIEGAS. Hoje, dando uma de Cleviegas, dos belos tempos de PANORAMA ESTUDANTIL, eu viajo na música de Luiz Gonzaga – LUIS, RESPEITA JANUÁRIO

A canção composta por Humberto Teixeira, retrata o exato momento em que Gonzaga, depois de 16 anos que “arribou de casa”, voltava agora famoso e endinheirado, com sanfona de 120 baixos querendo “mangar” da sanfona de oito baixos (modesta) do pai.  A canção lembra  uma “tunda” (quer dizer uma surra) que  Gonzaga levou de sua mãe (Dona Santana) e do seu pai, por conta de uma desfeita havida com o pai de uma moça a quem Gonzaga queria casar e que o pai o considerou um “safoneirinho, sem futuro”.

O interessante no composto  da canção é a cena, o enredo, a leitura ao vivo e a cores em tudo palpável, que nela se vê. Gonzaga queria chegar em casa alta noite e fazer uma surpresa ao seu pai, a quem mais ele se refere. Menciona que, de passagem por granito, foram logo lhe dizendo: De Taboca a Rancharia (cidades), de Salgueiro a Bodocó Januário é o maior”.

Gonzaga chegou ao terreiro de sua casa, madrugada altas horas. E então ele deu um grito: Ei de casa (ninguém responde).Torna a gritar (com mais força). Ei de casa (nada...ôxi). Então ele lembrou-se que àquela hora, no sertão, ninguém responde a um chamado. E então lembrou-se do prefixo, quer dizer do ditério, do costume; “Louvado seja o nosso senhor Jesus Criiiisto”. É quando de dentro de casa, Januário responde: “PARA SEMPRE SEJA DEUS LOUVADO”. Gonzaga na treita da surpresa lança um chamado: “Seu Januário, tô vindo do Rio de Janeiro, trago um recado do seu filho e trago até uma coisinha pra botar na sua mão”. E mais:  “quando vier de lá me traga um coco d’água que eu tô morrendo de sede”.

Interessante é como na canção a gente assiste aos detalhes, a gente olha e ouve os fatos, as pessoas, as vozes e todo um cenário daquela chegada. Gonzaga então observa pela “greta” quer dizer  pela fresta da janela quando o seu pai acende o candeeiro (que é a lamparina), e com um caneco leva-o ao fundo do pote; TIBUM... Esse TIBUM para quem conhece o pote como eu, conheço de perto, é a própria realidade. E esse COCO D’ÁGUA? Quem é nordestino e pobre, num tempo em que não havia bolsa família nem, nem bolsa escola e outras mesuras do governo, essa casca de coco (esse coco da praia, ou coco da Bahia) era serrado e prestava-se a uma vasilha, uma caneca, um copo. Daí que o filho pede ao pai – “quando vier me traga um coco d’água”

Tudo muito extraordinário explícito e genial na interpretação desse momento. O velho pai, então arreia o coco d’água e a lamparina do batente da janela, retira a tramela,  levanta a lamparina acima do rosto,  para  ver o chegante. É quando Gonzaga na canção faz a voz do pai: QUEM É VOCÊ. E Gonzaga na mansidão e matando saudade responde como na sua voz: “Sou eu, Luiz Gonzaga, seu filho..” É quando o  velho pai dá grito de exclamação na interpretação do filho: “Santana, Gonzaga Chegou!”.  Que momento extraordinário! É quando a filhara acorda e logo em seguida, a casa se enche de gente. Naquela noite ninguém mais dormiu e Gonzaga toca e canta até dia amanhecer....

Ocorreu que a certa altura daquele improvisado forró, Raimundo Jacó deu um brado: “Luis, respeita Januário, moleque. Esse “moleque” não tem sentido de ofensa E aí a composição completa: Tu pode ser famoso/ mas teu pai é mais tinhoso / E com ele ninguém vai. Luís / Respeita os oito baixos do teu pai”.

Tudo na canção é marcante e expressivo, explícito, contagiante, extraordinário! Tudo! Mas a passagem que me chama particular atenção é quando Gonzaga fala, na sua chegada, daquela “madrugada branca, madrugada sertaneja, com o céu cheio de estrelas, todas suas conhecidas, todas no mesmo lugar”.

As pessoas do asfalto, com as luzes da cidade acesa na noite, não observam, nem avaliam o romântico, a beleza, o extraordinário que é para o sertanejo UMA MADRUGADA BRANCA, UMA MADRUGADA SERTANEJA, - que é a dissertação a modo meu, para o CLUBE DA SAUDADE – A música LUIZ RESPEITA JANUÁRIO, DE Luz Gonzaga, que ora traduzo nestes... CAMINHOS POR ONDE ANDEI

 * Viegas questiona o social
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