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26/04/2024 às 18h50min - Atualizada em 26/04/2024 às 18h50min

Caminhos por onde andei

CLEMENTE VIEGAS

CLEMENTE VIEGAS

O Doutor CLEMENTE VIEGAS é advogado, jornalista, cronista e... interpreta e questiona o social.

...NO LIXÃO

Por último, passei  no LIXÃO oficial da cidade umas duas vezes (quatro vezes em ida de volta). Observo que lá tem um casal que até parece que, em tempo integral, vive no lixão, do lixão e para o lixão.  O homem, a mim me parece que assume no seu físico, todas as insanidades, insalubridades e o malgrado que é o LIXÃO. Ao passo que a sua mulher que igualmente labuta ali - uma mulher pequena, miúda, está sempre trajando um jaleco branco que à distância, me parece limpo. Não sei.

Passei ali a quarenta por hora, mas, aquela mulher pequena, jaleco branco que se me parece resignada com a vida que leva a vida nas entranhas e cercanias do LIXÃO, até parece que se foi atravessada na minha mente, qual se eu tivesse vontade de voltar, de conversar com ela, de lhe fazer mil perguntas. Mas aí já ia longe e a minha impetuosidade de quem não costuma voltar, não me deixou voltar. E fui tocando,  singrando o estradão de tantos caminhões a serviço da celulose. Uns que eu os encontrava e desviava, outros que para atrás eu deixava.  E fui embora. À noite, longe dali, no meu canto,  aquela mulher pequena que vive no lixão, continuava atravessada em minha mente. Era o meu lado “questionador do social” que me cobrava  rever, entender e sobre aquela mulher, escrever.

Semana passada, novamente, voltei por lá. Aquela tensão de tantas lembranças e cobranças, em mim já haviam se dissipado,  mas... quando passei pelo lixão, eis que tudo recomeça novamente! Sigo numa marcha em segunda, passando devagar em meio a urubus que se espalham no asfalto, quais os humanos, disputando, barafustando no lixão. Preocupa-me um incidente. Vejo que a mulher pequena, aquela do jaleco branco, agora não está lá. E até aquele casebre pequeno e baixinho que me pareceu ser sua casa (?), está fechado. Nem o seu cachorro estava por perto, como d’outras vezes.

Na volta, novamente, vou devagar, vou perscrutando, olhando, observando, tentando revê-la mas ela não estava lá. À qualquer hora por lá, novamente, vou voltar. E se eu encontrá-la e ela me der a oportunidade de lhe perguntar, então  um texto  por aqui, eu vou assentar.

- Eu olho uma mulher dessa/s e imagino que na vida, por aí, muitas pessoas precisam tão somente de alguém que lhe ouça;  de uma oportunidade, de uma alavanca para impulsionar. Mas... enquanto a sonhada oportunidade não chega, oportunidade que talvez nem se sonhe mais, ou ainda que nunca se tenha sonhado ou ainda que nunca chegue, as pessoas cortando e rasgando, vão sobrevivendo a duras custas, a duras lutas, aos trancos e barrancos nos lixões da vida por aí. Lixão! Um prato amargo e difícil, duro e cru, do qual já se  serviu tantas vezes a alma deste escriba, dando vazão e razão a este  inquieto questionador  do social!

E se o lixão para uns é um inverno ou um inferno; se para outros o lixão é verão, chance, uma solução – para muitos é sobrevida, é meio de vida. É a própria vida. Vida sofrida, difícil mas... enfim... a vida.

 
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