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26/04/2024 às 18h40min - Atualizada em 26/04/2024 às 18h45min

25 de abril de 1984

Mario Eugenio
Ao ser aprovado na Universidade Federal de São Carlos, um tio exclamou que eu moraria na “cidade vermelha”. Até então, tinha simpatia pela direita, o contato com diversas correntes comunistas, criaram-me um desdém ainda maior pela esquerda. Só passei a simpatizar pela esquerda após converter-me católico frequentando a Igreja de São Sebastião seduzido pelo som daquele órgão maravilhoso.

Assim que cheguei a Catanduva, vindo de São Carlos, para a Páscoa, fui à reunião da Juventude do PMDB. Não compactuávamos com as negociações dos mandachuvas que elegeriam o Tancredo Neves pela eleição indireta, precisávamos protestar. Creio que a ideia foi do Paolo Dias: fazer um enterro do Congresso Nacional!

Começamos a “convocar” todos os progressistas de Catanduva. Os mais velhos já diziam: “eu vou, mas nós seremos presos”. Jovens que éramos, não tínhamos medo e sabíamos da necessidade do risco pela “causa”.

Acompanhei o Paolo e ajudei-o a construir o esqueleto do caixão, em pouco tempo a urna imaginada pelo Paolo tomava forma. Sentimos uma ponta de orgulho pela “obra” e pela participação no momento político. Coube ao Paolo revestir aquele esqueleto de papel amarelo, que era a cor das Diretas-Já.

E assim foi, no dia 25 de abril de 1984, uma Quinta-Feira Santa próximo das 17 horas, concentramo-nos na Praça 9 de Julho, municiados do caixão, da faixa de protesto, de um surdo que retinia a cada dez segundos e de rojões. O temor da polícia e, consequente prisão tomou conta dos “adultos”. um dos nossos jovens, o mais alto (1,95 m) e forte, sentou-se na lanchonete, começou a beber e de lá não arredou pé, tremia da cabeça aos pés.

Contei umas dez pessoas, bastaria apenas um camburão... Iniciamos a descida da rua Brasil sob o olhar incrédulo das pessoas que passeavam, trabalhavam ou compravam. Incrivelmente, nenhum policial na rua. Ao chegar à rua Paraíba, perto do final, e sem que ninguém fosse preso, os populares entraram no “enterro”, inclusive alguns políticos do partido do Maluf (ex-ARENA, não me lembro como se denominavam naquela época).

Esquecemo-nos de avisar a imprensa e, até mesmo, de registrar o ocorrido com uma fotografia... O Maluf perdeu as eleições indiretas para o Tancredo. Mas, a “traição” do PMDB ao movimento das Diretas-Já foi imperdoável, um golpe fatal que esfriou os ânimos e extinguiu a Juventude do partido.

Cinco anos mais tarde, venci os preconceitos e aproximei-me do PT, onde reencontrei o entusiasmo. Partido que me custou preconceito, rejeição e, até mesmo, sabotagem profissional. Mas jamais desanimei. Até que encontrei “petistas” desonestos que me ameaçaram e me puseram para fora do partido.

Bem, na vida nada pode ser perfeito. Assim como o verdadeiro amor não consiste ver e viver apenas o que seja bom, na construção de uma poderosa nação temos que aceitar também os defeitos e permanecer do lado para ajudar a construir um mundo melhor. E, podem apostar, é melhor viver lutando para melhorar o mundo do que ser um empecilho. Que todos tenham sempre uma boa noite de sono e com bons sonhos. Se tiver a consciência tranquila!
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 *Mario Eugenio Saturno  (fb.com/Mario.Eugenio.Saturno) é Tecnologista Sênior do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e congregado mariano
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