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01/09/2023 às 17h27min - Atualizada em 01/09/2023 às 17h30min

Literatura que faz a cidade pulsar

Por Marcos Fábio Belo Matos
Manoel de Sousa Lima: o primeiro escritor de Imperatriz, que publicou nas primeiras décadas do século XX - Fotos: Divulgação
 
Quando eu cheguei a Imperatriz, eu não sabia nada da cidade. A não ser, claro, aquela história que se ouvia em São Luís (e no resto do Brasil), de ser a “terra da pistolagem”. Era isso que ecoava daqui para o resto do planeta. Eu cheguei e, curioso que sou, fui buscando informações sobre a cidade, sobre as pessoas, sobre aquilo que tinha importância local. 

E o primeiro aspecto que me saltou aos olhos foi a pujança literária e editorial de Imperatriz. Ali em 2006, estava em plena atividade intelectual e produtiva o querido Adalberto Franklin, tocando a sua Ética Editora, publicando como nunca, animado e falando de livros – dos seus e daqueles que saíam das suas máquinas.

Adalberto era um ser magnético. Quem com ele conversasse por poucos minutos ficava encantado com a sua paixão pelo livro. E, se fosse escritor, então, já saía com um contrato fechado “de boca” e veria seu livro dali a uns meses na prateleira da Ética. E foi com essa paixão que ele publicou centenas e centenas de livros, tornando a Ética a maior editora do Maranhão em número de publicações. Isso nunca foi superado. Adalberto nos deixou precocemente, em 2017, aos 54 anos.

Um segundo aspecto que se impôs na minha observação curiosa foi a força da simbologia da Academia Imperatrizense de Letras. Naquele prédio vistoso, localizado no coração da cidade, a poucos metros da UFMA (onde fui trabalhar como professor do Curso de Jornalismo), havia uma vida literária bastante interessante. Havia uma biblioteca que se abria para visitas, pesquisas, leituras e, principalmente, para os estudantes, e ainda guardava a coleção completa do jornal O Progresso, o mais antigo em atividade na cidade. Havia reuniões com a presença de uma boa parcela de seus membros. Havia atividades literárias, ocasionalmente. E havia ali a elaboração do Salimp – o famoso Salão do Livro de Imperatriz, que com o tempo ganhou projeção, importância e veio a se tornar uma das maiores feiras literárias maiores do Nordeste. Na verdade (e isso eu também aprendi), o Salimp não é só uma feira de livros; é um multievento, que reúne, além da venda dos livros e das iniciativas atinentes à literatura, festival de música, gincana cultural, exposição de artes plásticas, mostra de audiovisual, feira gastronômica. E é a única feira de livro tocada por uma academia de letras em todo o país. A AIL nunca se vestiu da vetustez de muitas das suas coirmãs, que se empolam nos seus próprios fardões e acabam por ser um reservatório de biografias que, ao fim e ao cabo, produzem muito pouco. Exemplos não faltam.

Preciso dizer que, como professor universitário que se interessou pela cidade, como leitor e fazedor de literatura, me interessei, diretamente, por conhecer o “caldo de cultura” da literatura local – na verdade, regional (isso eu também aprendi), pois Imperatriz não deve ser enxergada como cidade, mas como ponto de convergência de uma região que reúne dezenas de municípios. Fui conhecer o que faziam os escritores da região. E conheci muita gente boa fazendo muita coisa boa...

Conheci, pelas mãos do querido Ribamar Silva, um pouco da obra de Sousa Lima, considerado o primeiro escritor de Imperatriz, que publicou ainda nas primeiras décadas do século XX. Conheci a obra do próprio Adalberto Franklin, em especial o seu “História econômica de Imperatriz”, fundamental para quem quer se inteirar do processo de expansão dessa cidade. Conheci os livros de Edmilson Sanches, um autor também importante da bibliografia Imperatrizense, que publicou a seminal “Enciclopédia de Imperatriz”, uma espécie de Google das coisas da cidade. Conheci a trajetória poética de muita gente boa: Lilia Diniz, Elson Araújo, Adriana Moulin, Francisco Itaerço, Trajano Neto, Ita Portugal, Tasso Assunção, Zeca Tocantins, Ariston Di França, Cristiane Magalhães. Conheci uma prosa literária interessante com os livros de Francisco Aldebaran, Gilmar Pereira, Agostinho Noleto, Domingos César, Livaldo Fregona, Luís Carlos Porto, Sálvio Dino, Carlota Carvalho. A lista é enorme, já me escuso de esquecer alguém neste breve registro...

Por fim, é preciso registrar que o século XXI fez nascer uma vertente de autores e autoras que lançam um olhar literário-histórico-memoriabilístico sobre a cidade e suas gentes, fruto do esforço dos professores e professoras do Curso de Jornalismo da UFMA, que orientam produções de livros-reportagem. Assim, dessa ação já nasceram mais de 15 títulos, alguns já publicados em formato impresso, como: “História do Teatro em Imperatriz”, de Kalyne Cunha, “Nas ondas da memória”, de Nayane  Brito, “História da Imprensa de Imperatriz”, de Thays Assunção, “O que é que o Mercadinho tem”, de André Wallysson, “À sombra da Gameleira”, de João Marcos. São obras que enriquecem a literatura de Imperatriz e região e adicionam a ela um gênero novo, que é o livro-reportagem.

E a história, como é próprio dela, está sempre no devir. Muita coisa ainda há para ser lida, conhecida no panorama da literatura Imperatrizense. Muita gente nova (às vezes, muito nova!!) que vem produzindo e publicando, em formatos digitais, nas redes e comunidades virtuais, que eu ainda pretendo conhecer e ler. Como interessado nas coisas da literatura, venho buscando e publicando esses autores e autoras, tanto nas páginas do “Caderno Extra”, da Academia Imperatrizense de Letras, aos finais de semana, em O Progresso, quanto no site “Região Tocantina”, do qual sou editor-chefe – destaque para o projeto “Mural das Minas”, que entre 2000 e 2023 publicou 50 perfis literários de escritoras maranhenses, muitas deles de Imperatriz e cidades vizinhas. 

Uma cidade que tem na alma o germe do crescimento não pode ter uma literatura diferente dessa pulsação constante. 

 
SOBRE O AUTOR - É professor dos Cursos de Jornalismo e Pedagogia da Universidade Federal do Maranhão (UFMA). É integrante do Instituto Histórico e Geográfico de Imperatriz (IHGI). É vice-reitor e diretor de comunicação da UFMA (2019-2023). Pós-doutor em Comunicação pela Unisinos e doutor em Linguística e Língua Portuguesa pela Unesp/Araraquara. 

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