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17/12/2021 às 21h21min - Atualizada em 17/12/2021 às 21h21min

O ABRAÇO DO VARELLA

Elson Araújo
 
No Brasil não há pena de morte, salvo, conforme a Constituição Federal de 1988, em caso de guerra declarada. Também preceitua a Carta Maior, que não há pena de caráter perpétuo, de trabalhos forçados, de banimento e cruéis.

No Brasil, até pouco tempo, nenhum condenado podia passar mais do que   30 anos na cadeia, que era o tempo máximo de permanência no sistema penal.  Esse comando legal foi alterado recentemente pela Lei 13.964/2019.

A mencionada leifoi sancionada pelo presidente da República no final de 2019, e ampliou para 40 anos o tempo máximo do cumprimento da pena no País.A lógica da aplicação da pena de prisão é que os criminosos sejam exemplarmente punidospelos seus crimes, ressocializados e devolvidos para o seio da sociedade.  Sabe-se que nem sempre isso acontece. Com exceções, a cadeia acaba funcionando mesmo é como uma “escola do crime” com o apenado, na maioria das vezes, saindo mais embrutecido do que quando entrou. Isso, quando não sai escravo das facções.

Apostando na ressocialização, a Constituição Federal, e a Lei de Execuções Penais, abrem espaço para que entidades religiosas realizem atividades de evangelização, em alguns casos, com reconhecidos resultados positivos no sistema prisional.  Além disso, é permitido o trabalho voluntário, como o que o midiático médico e reconhecidamente ateu, Dráuzio Varela faz há anos,e que já lhe rendeu livros e reportagens, que permitiram mostrar para o Brasil e o mundo, o terrível universo da cadeia brasileira. Um até virou filme: Carandiru.

Não faz muito tempo Dráuzio Varella entrou no foco da metralhadora giratória de “crentes cristãos” e “não cristãos”, de todos os matizes, nas redes sociais depois de uma matéria em que exibiu em rede nacional um fragmento do sistema penal brasileiro: A vida das mulheres trans no ambiente prisional.

O objetivo da matéria, como ficou patente, não foi individualizar e chamar a atenção para o crime praticado por cada uma das personagens da reportagem.  O foco era mostrar o cotidiano daquelas apenadas, naquele ambiente, e não a ficha criminal de cada uma.

A reportagem foi ampla, contudo, o que ficou, viralizou , virou processo; rendeu pedidos de desculpas, e até hoje provoca  o ódio em  milhares de “cristãos”  foi a entrevista feita com a detenta Suzi.  No curso da entrevista o médico/repórter/ Dráuzio Varella se comoveu a ponto de no final da matéria ter dado um abraço nela. Abraço que provocouum terremoto na grande rede depois que se tornou público o crime que levou a mulher transpara o Sistema Penal: o estupro e morte de uma criança de nove anos de idade. Um crime abjeto, que resultou na prisão e posterior condenação de Suzy, que no cárcere, paga pelo crime que praticou.

O fato, embora figure ou sejaentendido como uma pavorosa gafe do Varella, até hoje abre espaço para uma reflexão sobre o exercício atual da cristandade, claramente distante daquele do período inaugural levado a efeito pelo Nazareno, há 2021 anos. Já escrevi sobre isso antes. Se voltasse hoje à Terra, e Ele adotasse o mesmo caminho, não duraria muito por aqui, não.  Na teoria, na retórica é muito fácil ser cristão, na prática é que a coisa muda de figura. Se servir de consolo para os raros que vivem, na acepção da palavra, o ser cristão, Ele mesmo profetizou: “E, por se multiplicar a iniquidade, o amor de muitos esfriará” (Mateus 24:12). E põe frieza, nisso!

De volta ao Varella.  O ato de abraçar aquela (e) apenada (o) e demonstrar ali um pouco de compaixão não poderia, no meu entendimento, ter sido visto, ou significado, condescendência com o crime praticado por Suzy, que sequer o médico humanista/ repórter e ateu, como ficou claro, tinha conhecimento, e conforme amplamente divulgado, não era o motivo da matéria.

Aquele abraço por mais que tenha causado, e até hoje causenojo nasociedade, bem como toda repercussão negativa gerada, demostrou, e poucas pessoas ou quase ninguém tem coragem de falar, o lado hipócrita de milhares de personas, que para efeitos estatísticos aparecem como cristãos, mas que estão muito, muito distantes da sua verdadeira essência.

Nesse episódio, o ateu Dráuzio Varella revelou uma capacidade muito maior de se colocar no lugar do outro (compaixão) do que muitos que se dizem cristãos e usam uma denominação religiosa para professar uma fé.  Como tenho dito, o mundo hoje precisa mais de espiritualidade do que de religiões, pelo simples fato de as religiões, quase sempre, separarem as pessoas, ao passo que a espiritualidade as unem.

A história, de alguma forma, insiste em demonstrar que o verdadeiro cristianismo morreu quando Cristo ascendeu ao Céu.
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