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12/04/2024 às 14h00min - Atualizada em 12/04/2024 às 12h00min

Sobre a gasolina, o céu é o limite?

"Se um cachorro morde um homem, isso não é notícia, mas se um homem morde um cachorro, é notícia". Era assim que o jornalista Amus Cummings definia os temas de cada edição do "The New York Sun". Se apenas o que foge à normalidade é notícia, ao completar seu primeiro mês, infelizmente a guerra na Ucrânia se torna assunto comum. Como a vida segue, outras preocupações começam a dividir as atenções da população. O aumento na gasolina era um medo, agora ele é real e o que todo mundo quer saber é: como ficará o preço?

Na economia mundial, o Brasil é importante na exportação de matérias-primas como, por exemplo, pedras preciosas e ferro. É o que se chama de commodity (mercadoria), material que é transformado em joias ou equipamentos eletrônicos em países mais desenvolvidos. Resumindo, vendemos material para fazer circuitos para placas eletrônicas e importamos celulares, TVs e computadores. Isso ocorre também com os combustíveis, onde o Brasil é grande exportador de petróleo bruto. Como nem tudo é refinado aqui, o preço final acaba naturalmente inflacionado. Como ocorre sempre, nem percebemos. Para nós, do Terceiro Mundo, esse é o jogo.

 

Já se tentou evitar o aumento da gasolina?

Desde os tempos de Getúlio Vargas, por causa de crises internacionais como a Segunda Guerra Mundial e a Guerra Fria, era comum que cada país buscasse ser autossuficiente. É aí que surgem estatais como a Petrobrás, em 1953, e campanhas governamentais como “O petróleo é nosso”.

Como nem sempre as necessidades de um país são imediatamente rentáveis, muitos desses empreendimentos têm que ser financiados pelo Estado, levando à criação das empresas públicas, como os Correios. Naquela época, só o poder público poderia financiar um serviço postal de abrangência nacional, o que, por consequência, trouxe benefícios para o setor privado em função do aumento no comércio entre os estados. Só que esse tipo de investimento pode levar tempo e embora possibilitasse fixar preços artificialmente, em especial durante o período militar, esse modelo não levou a tecnologia nacional à autossuficiência, por exemplo, no refino de petróleo. Apesar dos pesares, teve que ser assim até o fim da União Soviética e o encerramento da Guerra Fria.

 

O que a Buettner e Sulfabril têm com isso?

Com a calmaria internacional, os mercados nacionais foram abertos para o comércio estrangeiro e nem sempre as empresas locais conseguiram competir com os preços dos produtos importados. É o caso da finada marca de carros brasileiros, Gurgel, e também, por exemplo, o que contribuiu para a falência da Sulfabril, Buettner entre outras empresas de abrangência nacional.

Por outro lado, é pelo maior comércio internacional que hoje temos mais opções de produtos para consumir a preços acessíveis. É só olhar ao seu redor, o computador é de um país, a caneta de outro, as roupas de um terceiro. É aí que entra o problema da Rússia na economia mundial. Se a economia é globalizada, as crises também acabam sendo. Se os países de primeiro mundo cortam relações comerciais com a Rússia, ao mesmo tempo, ficam sem gás e petróleo russos e tudo encarece.

 

O que a política tem com tudo isso?

Nada incomoda mais o mercado financeiro que um ambiente hostil. Quem tem dinheiro precisa conseguir projetar se um investimento pode ser rentável, como e quando isso pode acontecer. Quanto mais agressivo for o ambiente, menos negócios serão realizados entre os países. É aí que entram a política e a gasolina brasileira. A falta de um produto dificulta a produção de outro e assim a alta nos preços vai se espalhando pela economia. Se a guerra durar muito tempo, é difícil que a gasolina volte ao preço normal. Em tempos de paz, é compreensível que o governo brasileiro não queira interferir no preço. Se a gasolina custa, por exemplo, 5 reais, pode-se vender a 3 nos postos, mas a cada litro vendido, o governo tem um prejuízo de 2 reais. Isso é uma bola de neve que já sabemos o quanto custou caro ao país. Entretanto, na situação atual de pandemia e guerra, diminuir o preço da gasolina artificialmente não seria compreendido como uma medida eleitoreira, mas uma necessidade para a população suportar a crise. Pandemia e guerra não vão durar para sempre, mas a economia tem que continuar andando até o fim de tudo isso. Aí é esperar que o governo consiga articular uma solução, o que se torna especialmente complicado em função das limitações do ano eleitoral.

Embora economia seja ciência exata, ela depende da política, onde nem sempre 2 + 2 é 4. Por outro lado, se a economia naufraga, qualquer governo cai.

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 Fernando Ringel   é jornalista e professor universitário. @FernandoRingel - [email protected]
 

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