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26/11/2021 às 21h41min - Atualizada em 26/11/2021 às 21h41min

O PEIXE LARANJINHA

Phelippe Duarte
 
O gigantesco peixe laranja movia-se em silêncio pelas águas da noite, empurrado pelos toques curtos de sua cauda em formato de meia-lua. A boca abria-se o suficiente para deixar passar um jato de água por suas guelras. Havia um outro discreto movimento: uma mudança eventual do curso, aparentemente sem sentido, feita por um leve levantar ou abaixar da barbatana do peito — como um pássaro que muda de direção abaixando uma asa e levantando a outra. Os olhos não enxergavam no escuro e os outros sentidos não emitiam nada de extraordinário ao cérebro pequeno e primitivo. O peixe laranja deveria estar dormindo, exceto pelo movimento ditado por incontáveis milhões de anos de continuidade instintiva: à falta de uma bexiga de flutuação, comum a outros peixes, e de aletas móveis para liberar a água carregada de oxigênio por entre suas guelras, ele só sobrevivia caso se movimentasse. Uma vez parado, afundaria até o fundo do mar e morreria por asfixia. A terra parecia quase tão escura quanto a água, pois não havia lua. Tudo o que separava o mar da areia era uma faixa longa e reta de praia — tão branca que brilhava. 

Calma, amigos. Não é o primeiro parágrafo do best seller de 1974, Jaws, de Peter Benchley, que originou o clássico Tubarão, de 1975 de Steven Spilberg. Não. É a trajetória infalível do laranjinha da zona azul. Você estaciona seu carro. Olha para frente. Para trás. Olha para os lados, direita, esquerda. Não há ninguém. Quando você abre a porta do carro, e o seu odor invade as ruas, eis que surge do NADA: O peixe laranja faminto da zona azul. Ele não escolhe veículo. Não escolhe roupas. Ele não escolhe cheiros muito menos odores. O peixinho laranja aparece do NADA, e ataca com a fome insaciável de um Tubarão que não come há 30 dias. Ele precisa movimentar-se para sobreviver. Um descuido, uma criança estacionando a bicicleta de forma errada, e ele estará ali, com seus olhos negros mortos, sem vida, trabalhando apenas os dedinhos naquele aplicativo maldito. Às vezes você estaciona o seu carro, e passa por eles. Eles ainda não sentiram as vibrações vindas do seu deslize em deixar o seu carro na frente do seu ganha pão, mas é só você virar a esquina...olhe de novo: ele estará do lado do seu carro, como um Tubarão comendo vísceras marinhas, balançado a sua calda para impulsionar a mordida certeira. Raramente ficam sobreviventes do ataque feroz do bicho. Sequelas ficam mensalmente, e se você não tomar cuidado, todos os dias pode perder aos poucos um braço, uma perna, as mãos... até perder a cabeça, e de vez, o juízo. Como fazer para evitar o peixe laranja??? Como conseguir escapar de alguém que te cerca POR TODOS OS LADOS? Não adianta nadar ou acelerar parceiro. Nem fugir daqueles dentes e daquela boca gulosa municipal. Faz como a moça, primeira vítima do livro de Peter Benchley: nada. Quando o peixe laranjinha detecta os movimentos nas ruas, ele muda de direção rapidamente. O carro está a cem metros. O peixe acelera os movimentos, as botinas pretas em passos largos. Mesmo se os cadarços estiverem desamarrados, não há tropeço. Ao farejar a multa, ele ataca. ‘’ Moço, eu já estou saindo’’. Mesmo assim. O peixe termina a sua ação com tamanha veracidade municipal, que o único jeito, é render-se, e esperar que a organização que buscam, não precise acabar com o bolso alheio. O gigante peixe laranja obedece ordens. Eles não tem culpa. O peixe laranjinha poderia ser o Nemo. Ninguém iria procurar. Pedestres, jogadores de futebol dos campos da BR, moradores de rua, pessoal da panelada, Papai Noel, cuidado!!!! Vocês podem ser a próxima vítima, numa história sem final feliz (para todos nós).
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