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17/05/2021 às 00h00min - Atualizada em 17/05/2021 às 00h00min

IMGUINORAPULIS

Capítulo V

JAURO GURGEL

JAURO GURGEL

JAURO José Studart GURGEL, durante muitos anos Editor Regional de O PROGRESSO, em Araguaína (TO),

*Republicado a pedidos
**Publicado originalmente em 23 de setembro de 2012


Começa o festival de besteiras!

O prefeito acena para a multidão, pega o microfone das mãos do locutor oficial, solta o tradicional pigarro e inicia, emocionado, o seu tão aguardado pronunciamento. OTORIDADE CIRVIR, MILITAR, ECLESIASTA E DE OUTRO TIPO, AQUI PRESENTE E ALI AUSENTE! MEUS POVOS E MINHAS POVAS! CRIANÇAS E CRIANÇOS! CUMPADES E CUMADES! GRAÇA AO MEU INSFORÇO E O MEU TRABAIO, AO POUCO A NOSSA IMGUINORAPULIS TÁ MUDANDO A SUA FISIONOMIA FIOSIOLOGICA!".

"Muito bem!", gritou bem alto o companheiro ZÉ, em tom de gozação, enquanto eu me limitei a um sorriso irônico, até certo ponto agradecido por ele não ter iniciado o seu discurso com o tal de brasileiros e brasileiras, ou então o chatérrimo "minha gente", ou "cidadãos e cidadãs", e assim por diante. Mas o certo é que o grito gozador do ZÉ foi entendido de outra forma, haja vista que o povão repetiu o "muito bem" e passou a aplaudir entusiasticamente o chefe da municipalidade, que revelava ser um líder popular.

Foram mais de duas horas de poluição auditiva, mais de 120 minutos de uma verdadeira sessão de tortura, onde a grande vítima era a pobre e indefesa Língua Portuguesa, cruelmente assassinada por expressões tipo "Nós vai", "A gente fomos". Certamente, o padre Antonio Vieira, Rui Barbosa, Olavo Bilac, Carlos Drummond de Andrade e outros monstros sagrados da nossa língua, nos seus túmulos, ficaram avermelhados, de raiva e de vergonha, com as barbaridades que eram pronunciadas naquele momento solene. Felizmente, para a nossa agradável surpresa, o pronunciamento do senhor prefeito foi fechado "com chave de ouro", haja vista ter pronunciado corretamente as duas palavras de encerramento, no caso o tradicional "Tenho dito". Embora tal frase tenha sido lida.

"Que alívio!", comentei baixinho com o ZÉ, que quase morria de tanto rir. "Cada povo tem o governo que merece!", respondeu o meu companheiro de aventura.

Depois do palavratório do DOTO LADRONESIO FURTADO, o locutor oficial da solenidade tomou de volta o microfone e anunciou o reinício do show artístico da dupla sertaneja PAUL AND JOHN, que cantaria o grande sucesso do momento, o "Melô do Miserável", composição imortalizada pelo rei Roberto Carlos. "Que música é esta?", perguntei ao ZÉ, que na mesma hora me fazia a mesma pergunta. E para a nossa surpresa, a desafinada dupla começou a cantar: "Amanhã de manhã, vou pedir um café pra nós dois...". Realmente, um indivíduo que pede um só café para duas pessoas é mais que miserável.

Aos poucos, o povão ia deixando o local da concentração popular. Em dado momento, apenas cinco pessoas se faziam presentes no local: eu e o ZÉ, parados diante do palanque; a dupla PAUL AND JOHN, cujos nomes de batismo eram Quincas e Severino, a interpretar mais uma música do seu vasto repertório, e o locutor oficial, que também ficara em cima do palanque, e a cada intervalo musical "puxava o saco", elogiando e enaltecendo as grandes obras do DOTO LADRONESIO FURTADO.

Olhei para o relógio que trazia no pulso e me surpreendi com o adiantado da hora: era mais de meia noite. Abri a boca, passando as costas das mãos nos olhos, gesto este que foi entendido pelo amigo ZÉ como um convite para nos retirarmos do local e procurarmos um local para comer alguma coisa, pois ouvíamos o "roncar da barriga" se queixando de fome. Mas, antes de sairmos, aplaudimos a dupla que interpretava uma outra melodia, pois sabemos ser o aplauso o verdadeiro alimento do artista. Fomos, então, em busca de um local onde pudéssemos fazer uma refeição e em um dos quatro cantos da "Praça dos Bodes", nome como era conhecida popularmente, já que de forma oficial ela se chamava "PRASSA MAI DO DOTO PREIFEITO" (era assim mesmo que estava escrito nas placas colocadas nas paredes de casas), descobrimos uma tal XURRASKARIA KIKAI NAKEDA, de propriedade de dois irmãos gêmeos japoneses, de nomes bem curiosos e engraçados: TAKAKARA NUKU e TAKUKU NAKARA.
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