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24/02/2024 às 00h00min - Atualizada em 24/02/2024 às 00h00min

Crônica da Cidade

AURELIANO NETO

AURELIANO NETO

Doutor Manoel AURELIANO Ferreira NETO é magistrado aposentado do Tribunal de Justiça do Maranhão, e membro da AML e AIL - [email protected]

O Presidente Lula está certo ou errado?

A resposta a esta questão exige um aprofundado exame de vários e poderosos interesses. E um deles é o econômico: a indústria armamentista. Um outro são os judeus israelenses, ou espalhados por todos os cantos da terra, desde os primórdios da sua história, têm encontrado resistência em todas as épocas de sua existência, razão pela qual foi criada a expressão antissemita, que denota o sentido de hostilidade racista contra o povo judeu. Deve ser esclarecido, antes de mais nada, que sionismo ou antissionismo têm outro significado, ora admitido por algum segmento judaico, ora negado pelos denominados judeus ortodoxos, que, em declaração do perfil Torah Judaism, publicada no antigo Twiter, em 11 dezembro de 2023, fazem esta afirmação: “Os sionistas são os nazistas de hoje; seus corações estão cheios de puro mal. O sionismo é uma ideologia política inventada por um pervertido chamado Theodor Herzl, um inimigo da humanidade. O mundo inteiro precisa lutar contra esses genocidas assassinos, inimigos da humanidade, ladrões e mentirosos.” Essa manifestação desse grupo de judeus foi publicada, mas sem nenhum destaque. Apenas publicada.

Mas o que é o sionismo? Os pesquisadores dizem que o termo sionismo faz referência ao Monte Sião, nome das colinas de Jerusalém e usado como sinônimo de terra prometida, ou terra de Israel. Mas a sua concepção semântica é geradora de divergência entre os movimentos que militam a favor ou que são contrários à criação de um Estado judeu. Afirmam os estudiosos que o sionismo é um movimento fundado na religião para objetivos políticos, e essa conexão entre religião e política se amalgama numa religião-política. O seu fundador Theodor Herzl teve como fundamento o direito de os judeus terem um Estado próprio, para viver em paz com a sua identidade político-religiosa. E o local seria a Palestina, por ter uma ligação histórica e bíblica.

O historiador e professor da UFRJ, Michel Gherman, que é judeu, esclarece que “em resumo, eu diria que o sionismo é um movimento que se constitui pela construção da identidade nacional do povo judeu. Note que eu não falo sobre o Estado de Israel quando defino o sionismo, porque algumas correntes do sionismo, que é um movimento diverso, não têm como objetivo final a construção do Estado de Israel”.

No livro Antissemitismo, explicado aos jovens, Edições de Janeiro, 2014, Michel Wieviorka faz um estudo esclarecedor sobre o povo judeu e seus graves problemas que o acometeram durante toda a sua história, até os tempos atuais. Ao responder à pergunta Por que esta hostilidade contra os judeus? Ele responde: “É exatamente sobre isto que iremos falar! A hostilidade contra os judeus, que em toda parte são uma minoria (exceto em Israel, hoje em dia), é encontrada em todas as épocas. Ela surge particularmente nos períodos conturbados, em tempos de crise econômica e social.” Assim, o antissemitismo decorre do arianismo europeu. E há uma definição antissemita que identifica o povo judeu como ávido por dinheiro. O Mercador de Veneza é uma obra que contempla esse tema.

De volta à pergunta que abre este texto, que envolve a declaração do Presidente Lula condenando a guerra genocida do Estado de Israel, mais precisamente do povo judeu, contra o grupo de guerrilheiros Hamas, cujo alvo de destruição é a Palestina e o povo dessa terra secular. Consoante foi noticiado, o Presidente Lula, ao insurgir-se contra a matança da indefesa população da Palestina, comparou os crimes praticados por Israel ao holocausto sofrido pelo povo judeu na II Guerra. A respeito, diz o noticiário: “Neste domingo (18/02), (...) Lula comparou o desastre humanitário em Gaza ao Holocausto, ao criticar países ricos que suspenderam o financiamento à Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina no Oriente Próximo (UNRWA, na sigla em inglês). As doações foram interrompidas após o governo israelense denunciar que funcionários do órgão haviam participado do ataque terrorista do Hamas a Israel em outubro. (...) Em janeiro, oito países — Austrália, Reino Unido, Canadá, Itália, Suíça, Holanda, Alemanha e Finlândia — se juntaram aos Estados Unidos na suspensão temporária do financiamento em um momento em que a falta de recursos aumenta no enclave. A UNRWA, por sua vez, anunciou que iria iniciar uma investigação e afastou ‘vários’ acusados.”

Os países, acima, por ação ou omissão, têm participação efetiva na prática dos crimes de guerra de Israel contra o povo palestino, com a matança de milhares de crianças e indefesas mulheres, sob o argumento de combater os guerrilheiros do grupo terrorista Hamas.

Embora a nossa grande mídia impressa e televisada, entre as quais o sistema Globo (como sempre, lembre-se de 1964) concorde com a prática de todos esses crimes contra a humanidade, por ferir os direitos humanos fundamentais, protegidos pela Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 e a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, acolhidas pelas nações civilizadas, o jornalismo que pensa e examina com responsabilidade os fatos, não condena a posição do Presidente Lula. Ou quando equivocadamente condena, ao mesmo tempo, concorda. É o caso de Mário Vítor Santos, Hildegard Angel, a própria ONU, e Guga Chacra, colunista do Globo e comentarista de política internacional da Globonews, cujo texto publicado recebeu o título: “É legítimo Lula criticar Israel por Gaza, mas é antissemita comparar a Holocausto.” É legítima a crítica condenatória do Presidente Lula, mas longe está de ser antissemita, assim como tem condenado os ataques do grupo guerrilheiro Hamas. Numa das passagens dos seus argumentos, ora apoiando as palavras do Presidente Lula, ora se contrapondo, o jornalista Guga Chacra escreve: “Crimes de guerra claramente têm sido cometidos pelas forças israelenses na Faixa de Gaza na resposta ao atentado terrorista do Hamas. São quase 30 mil mortos, sendo a maioria composta por mulheres e crianças palestinas. A cidade de Gaza, a maior do território, foi completamente destruída nos bombardeios. Mais de 1 milhão de palestinos foram forçados a deixar suas casas. O presidente Lula, portanto, não estaria errado se questionasse e criticasse Israel por essas ações militares. Mas erra de maneira gravíssima ao comparar ao Holocausto, quando 6 milhões de judeus foram mortos em escala industrial pelo regime nazista.”

Por essas simples e graves razões humanitárias, não há que se condenar o Presidente Lula, mas apoiá-lo, em defesa das crianças e das mulheres diariamente assassinados por Israel.

* Membro da AML e AIL
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