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09/09/2023 às 00h00min - Atualizada em 09/09/2023 às 00h00min

GONÇALVES DIAS NÃO MORREU!

ELSON ARAÚJO

ELSON ARAÚJO

ELSON Mesquita de ARAÚJO, é membro da Academia Imperatrizense de Letras-AIL e durante alguns anos, foi repórter de O PROGRESSO.

 
Meus confrades da Academia Imperatrizense de Letras (AIL) me desafiaram a preparar uma minipalestra sobre o grande poeta romântico, o maranhense Gonçalves Dias. Seriam 15 minutos de fala, no sarau promovido pela casa para a homenagem aos 200 anos do nascimento do poeta caxiense. Intimamente relutei, mas além de gostar, aceitei o desafio.

De imediato, para fugir do lugar comum, e fazer algo diferente, tive uma ideia. Mas para operacionalizá-la o primeiro passo seria contactar o maior estudioso brasileiro da vida e obra gonçalvina, o intelectual membro fundador da AIL, o jornalista Edmilson Sanches. Ele gostou da ideia e até me calçou com fatos novos sobre a vida do poeta conterrâneo, que ele ainda vai escrever.

Sobre o pendor pela obra de Gonçalves Dias, Sanches me disse ter se desafiado e já começou a ler os primeiros livros lidos pelo autor do festejado poema Canção do Exílio, tudo para uma melhor imersão no que foi a formação inicial cultural de um dos maiores intelectuais brasileiros paridos em terras maranhenses.

O que segue, é uma espécie de rascunho que fiz para não ultrapassar o tempo que me deram, e também para, pelo menos, chegar próximo da expectativa de quem acompanhou, naquela noite do dia Primeiro de Setembro de 2023, o Sarau da AIL. Na contagem do confrade Edmilson Franco, gastei menos do que os 15 minutos acordados.

Vamos, lá!

É um grande desafio, em tão pouco tempo, falar sobre essa figura exponencial da literatura brasileira. Tanto já fora dito, nos mais diversos formatos, sobre a vida desse maranhense, que morreu na flor da juventude, que fiquei a racionar sobre o que mais poderia se dizer dele.

Haveria algo mais a se falar sobre um dos pais do romantismo brasileiro, e não cair no lugar comum?

No exercício desse raciocínio, logo no início da viagem mental sobre o que teria sido a curta vida do poeta, uma certeza: sempre haverá algo a dizer desse maranhense nascido nas cercanias da hoje Caxias e que ganhou o mundo, e os corações do mundo.  

Que o diga nosso confrade Edmilson Sanches, o mais entusiasta e pesquisador da vida do seu conterrâneo e vizinho. É, o jornalista e pesquisador Sanches morou um bom tempo próximo de onde nasceu e viveu, até seguir para a lida dos estudos, em Portugal, o nosso poeta maior.

Registre-se, nosso confrade Sanches já escreveu e publicou pelo menos três obras sobre Gonçalves Dias, além de diversos artigos e inúmeras palestras.

Coincidência, ou não, o escritor caxiense/imperatrizense, assim como Gonçalves Dias, é um reconhecido homem das letras. Um apaixonado pela literatura e as artes.
Pelo legado, Gonçalves Dias não morreu! Tanto, que hoje estamos aqui, a celebrar, neste mês, que não é o mês dos desgostos, os 200 anos do seu nascimento, ocorrido aos 10 dias de agosto de 1823.

Gonçalves Dias está vivo, e bem vivo!  

Além da imortalidade, o que mais o poeta poderia legar nos dias de hoje a nós, simples mortais, que padecemos neste solo em saltos e sobressaltos?

Um ser abençoado!

Transportemo-nos para as condições do nascimento do poeta, num ano em que a expectativa de vida dos brasileiros era de apenas 33 anos. E Por que a expectativa era de apenas 33 anos? Não é difícil de se explicar. A maioria das pessoas bebia água de poços ou de rios, que muitas vezes estavam contaminados. Isso contribuía para a propagação de doenças de veiculação hídrica. Some-se a isso as condições de higiene pessoal, precárias. Muitas pessoas não tinham acesso a água corrente ou a produtos de higiene pessoal, que também ajudava na disseminação de doenças.

Se hoje nosso País ainda padece com problemas similares, imagine naquele tempo.

Consequência dessas condições era que, naqueles tempos do Nosso Senhor Jesus Cristo, a taxa de mortalidade infantil no País era de 250 mortes a cada mil nascidos vivos, o que significa que em média, 250 crianças em cada mil, morriam antes de um ano de idade. Hoje, para efeito de curiosidade, a taxa de mortalidade infantil no País é de 13,2 mortes a cada mil nascidos vivos.

Já está provado que o poeta Gonçalves Dias não nasceu num grande centro. Além do mais, é possível inferir que não veio ao mundo cercado por médicos e enfermeiros. Até porque o primeiro curso de medicina surgira cinco anos antes em Salvador, Bahia. A história registra o nascimento, e não as circunstâncias do nascimento do poeta. Portanto, é de imaginar que tenha nascido pelas mãos de alguma experiente parteira, talvez uma escrava do pai, um bem sucedido comerciante.
 
Viver é lutar! É de se concluir, que o primeiro grande feito de Gonçalves Dias, filho de um comerciante português e de uma mestiça, foi em condições inóspitas, ter nascido vivo, para ganhar e conquistar o Maranhão, o Brasil e o Mundo, com sua literatura.

Infância - Como teria sido a infância de Gonçalves Dias, como teria nascido nele o gosto pela literatura? Pelo que é possível se extrair de sua biografia, o pai por ser um comerciante europeu, que em dias de hoje poderia pertencer à classe média, sabia da importância da educação e sem tempo para acompanhar o filho teve condições financeiras e a inciativa de contratar um professor/a particular para atender às necessidades de escolarização do filho, preocupação fora da curva no interior do Maranhão oitocentista, não acham?

É de se imaginar, e talvez concluir, que a semente da literatura tenha sido plantada no poeta nesse contato inicial com esse professor (a), que certamente deve ter revelado ao menino Gonçalves Dias as aventuras e venturas do hábito da leitura legando-lhe os clássicos da literatura da época.

Quantos livros ele leu na infância, não é possível mensurar, mas que é possível concluir pelo avanço da genialidade do menino, que teria lido algumas dezenas. Se tivesse seguido o exemplo do pai, e não a do professor (a) talvez Caxias tivesse produzido um grande empresário, e não um grande escritor. É de fácil conclusão que os livros, e as horas de leitura, fizeram toda diferença na formação do então infante Gonçalves Dias.

Viva, os professores, viva a educação!

Gonçalves Dias viveu no endereço onde nasceu até os 14 anos, quando viajou para estudar em Portugal. Outros estudiosos dizem que essa viagem teria ocorrido aos 15 anos, porque antes ele teria estudado em um colégio de orientação Jesuíta, em São Luís. Essa passagem não é reconhecida por estudiosos como o confrade Sanches, que a refuta de forma veemente e assegura que essa passagem por São Luís, não ocorreu. De Caxias, ele foi direto para Portugal.

Façamos mais um exercício mental. Como teria sido a chegada do garoto Antônio Gonçalves Dias a Portugal? Os oito mil quilômetros pelo mar, distância entre os dois pais, eram vencidos em 40, 50 ou mais dias em embarcações precárias, mas ele conseguiu chegar ao País natal do pai.

 É de supor, que algum parente o tenha recebido e dado o apoio necessário ao futuro fundador da cadeira 15 da Academia Brasileira de Letras. Na bagagem, o mundo que já conhecia, por meio dos livros. É também de se intuir, que atilado como era, o menino não chegou como um bocó. Carregava consigo um certo capital cultural, fruto das aulas particulares recebidas em casa e das leituras que fizera. Não é de se duvidar que também tenha lido muito sobre o País no qual  acabava de chegar.

Foi na capital lusitana, durante seus anos de estudos, que o maranhense teria tido contato com as ideias do romantismo europeu, o que segundo seus biógrafos, influenciaram toda sua obra. Não, é por acaso, portanto, que ele é laureado como um dos maiores poetas do romantismo brasileiro, e principal representante do indianismo na literatura nacional.

Parece até maldição dos gênios. O poeta viveu pouco, mas o suficiente para se imortalizar no panteão dos grandes nomes da Literatura Brasileira, sendo celebrado como o grande poeta indianista da primeira geração romântica e um dos melhores poetas líricos da literatura brasileira.

Em 41 anos de vida entremeou caminhada terrena como advogado, professor, poeta, etnógrafo, teatrólogo e jornalista.

Se hoje, todo esse protagonismo ainda é motivo de espanto, imagine naquela época. Uma personalidade que merece o respeito nacional e todas as homenagens que forem necessárias. Um homem além do seu tempo.

Como é possível depreender da trajetória de Gonçalves Dias, os ares do velho mundo ampliaram a visão do maranhense. Viajar, nem que seja na imaginação é preciso, (risos). Depois de formado e de volta ao Estado, as terras maranhenses ficaram pequenas para a luz literária do poeta e ele muda-se para o Rio de Janeiro, onde o Brasil acontecia. Na cabeça, a clara intenção de se integrar ao meio literário.

Imagina-se que naquela época, não era fácil, furar a bolha da elite literária, mas como talento é tal qual um insistente pingo d´água, somado a isso a inteligência, ímpar, do maranhense, em 1847, com Primeiros Cantos, conseguiu sucesso e reconhecimento público.

Uma, entre muitas peculiaridades da trajetória do poeta descoberta por Sanches era seu pendor pelo aprendizado de línguas. Além do Português falava fluente, francês, alemão, inglês, latim e outros idiomas. De acordo, com Edmilson Sanches ele chegou a dominar, com o português, pelo menos oito idiomas.

Ah, antes que eu esqueça, Gonçalves Dias ainda lutou pela abolição da escravatura e pela defesa dos direitos dos povos indígenas. Infelizmente não viveu o suficiente para assistir a assinatura, em maio de 1888, da Lei Aurea. Sua vida foi tragicamente interrompida em 1864, em um naufrágio durante uma viagem de vapor para o Maranhão. Dias foi dado como desaparecido e presumivelmente falecido aos 41 anos de idade.
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