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01/07/2023 às 00h00min - Atualizada em 01/07/2023 às 00h00min

CAMINHOS POR ONDE ANDEI

(Eis a natureza, eis a vida!!!)

CLEMENTE VIEGAS

CLEMENTE VIEGAS

O Doutor CLEMENTE VIEGAS é advogado, jornalista, cronista e... interpreta e questiona o social.

UMA GOIABEIRA SOBRE O ASFALTO 

Quem andava por aqui, na toda minha Rua Coronel Manoel Bandeira, imediações da Rua Benedito Leite, até que podia ver uma jovem, mediana, atrevida e petulante goiabeira com uma copa “horizontalizada”, em pleno frescor da juventude, entremeada de frutos ainda pequeninos, espalhados sobre os seus galhos em meio ao verde-folha de sua ramagem. É a cria da Natureza; é a mão Deus que estavam ali, naquela jovem e sofrida goiabeira!

E nasceu e se criou entre pedras - exatamente no ponto que faz um ângulo de noventa graus, entre a calçada alta e o asfalto da rua, num local íngreme e jamais sequer imaginado que ali poderia nascer crescer ou viver uma goiabeira, em plena rua de trânsito e asfalto. Mas, é como diz a canção: “... Sobre montes de pedras / Também nascem flores”.

Passava eu por essa cria da Natureza, obrigatoriamente, todos os dias. Moro ali perto. Por conta dessa vizinhança, tive – ainda que de passagem - acompanhado o seu crescimento, como bem assim a tentação do desafio a que ela – goiabeira – se submete à margem do leito da rua, na beira da calçada, em cima do asfalto.

Por vezes me pegava cara a cara, olho no olho, proposital, junto dela. E me perguntava: Como pode uma goiabeira nascer e crescer e frutificar sobre pedras e entre pedras?! Vizinhos que fomos, bateu-me um quê de interrogação e, debaixo de uma então renitente chuva fina fui lá, vê-la de perto, contemplá-la decerto. Pude observar que essa criatura de Deus está crescendo mutilada pelo pé. É que, espremida entre a calçada de pedra e a cepa do asfalto que faz o meio-fio (a sarjeta), o vegetal não teria condição de se desenvolver regularmente. Senão às turras diante do que a mim me pareciam estivessem duramente comprometidos seus dias futuros.

Tem mais, sobrevida natural do vegetal (da goiabeira), implica num processo de fotossíntese que é o processo do alimento natural, através da luz solar, compondo nessa cadeia alimentar o oxigênio, a glicose e o gás carbônico. Esse desenvolvimento (crescimento) natural, como se observa, fazia-se em parte comprometido porque o vegetal não tem a alternativa do crescimento vertical e daí uma consequente atrofiação; demais ainda o vegetal posta-se adernado para o leito da rua, ocupando a meia altura, parte da rua.

O desafio que enfrentava essa goiabeira exposta a céu aberto e em pleno asfalto, ou como se diria: “no meio da rua”, também desafiava a mim, seu vizinho, admirador e acompanhante voluntário de parte de sua trajetória, temendo que a qualquer momento fosse ceifada porque o que a natureza constrói em uma vida, o homem e capaz de destruir num instante.

Outrossim, seus pequenos frutos à altura das mãos dos transeuntes, dificilmente chegariam ao amadurecimento, isto porque as mãos desocupadas logo encontrariam o que fazer, tal a iminente perseguição a que se fazia submetida. Logo ela que estava na 5ª geração de sua exposta frutificação. E nessa observação vou à Escritura Sagrada em Lucas 23:29: Felizes as estéreis e os ventres que não geraram e os peitos que não amamentaram.

O tempo passou. Ainda que por pouco tempo. Agora, estava novamente diante dessa criatura:  Via que já não existia mais nela quase nada mais do que antes era ela. Nem a vegetação, nem o verdor, nem a galhagem em copa horizontalizada, nem flores, nem os pequeninos frutos. Nada, nada. Nela já não reinava beleza, nem vida, nem o frescor nem o verdor: Estava alquebrada, debilitada, doente terminal, mais morta do que viva. Nem vegetando não mais estava. Lembrava, quando muito, uma velha senhora de cabelos desgrenhados, soltos, abatida, agonizando, mais morta do que viva. Podia vr então que a vida é mesmo assim: é princípio, meio e fim.

Na savana os turistas vêm de braços cruzados a carnificina entre os animais e nada fazem nem para afugentar o mais forte, nem para salvar o mais fraco. Contudo regozijam-se: Fazem fotos e vídeos, sorriem, escarnecem diante da desgraça alheia.  Aqui, sobre o asfalto, as pessoas viam a Goiabeira agonizando e nada faziam. Assim são as pessoas; assim são as criaturas, sejam elas animais ou vegetais. Eis a natureza! Eis a vida!

(E até parece que os donos daquela calçada só viram aquela goiabeira, depois que eu me interessei por ela, já adulta, atrofiada e mutilada. E ainda assim, produzindo. E nada fizeram por ela. E nada permitiram fazer nela. Devem ter feito fogo dos seus restos; do seu precioso lenho seco). Este texto, agora reeditado, tem mais de seis anos que fora escrito pela primeira vez.

 
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