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23/10/2021 às 00h00min - Atualizada em 23/10/2021 às 00h00min

NO AEROPORTO...

(3ª. edição. Inédita!)

CLEMENTE VIEGAS

CLEMENTE VIEGAS

O Doutor CLEMENTE VIEGAS é advogado, jornalista, cronista e... interpreta e questiona o social.

 
Já disse por aqui que o aeroporto (local) me desperta “mil e uma inspirações”, sempre que ando por lá. Quer ver lugar de “gente esticada” de egos inflados, nariz empinado e tamanco em salto alto?! E então o título desta, não é “AEROPORTO...” qual está escrito aí em cima mas... “O AEROPORTO É LUGAR DE GENTE ESTICADA”. Não atribuí esse título por que fica muito comprido. Nessa cepa, a vida me ensina que quando menor o título no jornal, melhor para o sentido  e absorção da “manchete”. Ora! Se eu colocasse: “O AEROPORTO É LUGAR DE GENTE ESTICADA”, utilizaria duas linhas de título e isso não me agradaria. Por isso não coloquei O AEROPORTO É LUGAR DE GENTE ESTICADA, mas ainda assim, leia-o, como se o seu título fosse. Fechado assim, Elson Araújo?

01 – Chego ao Aeroporto (que eu escrevo com inicial maiúscula, como nome próprio), por volta de uma e vinte da madrugada. O ambiente do/s estacionamento/s é ermo, vazio. Já  fico assim um tanto num pé e noutro. Logo, logo ali vem um sujeito, passa bem ao meu lado e, bem ali adiante, URINA, em pleno estacionamento, ao vivo e em cores. Não estou dizendo? O AEROPORTO É LUGAR DE GENTE ESTICADA. Só que esse aí perdeu o caminho da civilidade e o viés da cidadania.

02 – Lá dentro me encontro com o CHICO BRASIL. Ele está numa cadeira de rodas. Um tanto à distância, não reconheci integralmente o Chico, e fiquei na dúvida. Parei... olhei mais detidamente, num cenário que me pareceu um “tête-à-tête” E então me dirijo ao Chico e cumprimento-o com o punho fechado. Daí a recíproca. Conversei com o CHICO longamente, coisa que outrora nunca fizemos. Mas está na Escritura da Criação que “Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo o propósito debaixo do céu”...

Chico, fluente, me disse que teve dois AVC’s e que  ali estava a caminho do HOSPITAL SAARA KUBITSCHEK, em São Luís.  Perguntei-lhe sobre a possibilidade de recuperação dos movimentos das pernas e ele me falou entusiasmado que teve uma indicação positiva na fase de avaliação preliminar. E então exclamei, perguntando: Uma dificuldade conseguir uma vaga no Saara, não Chico!? E ele me respondeu: Graça a bons amigos que tenho, foi fácil. Agora digo eu: Parabéns, Chico, por você existir, pelos seus amigos que existem, pela Saara Kubitschek que também existe. Só que Chico, ali no Aeroporto se esqueceu de agradecer a Deus por permanecer vivo e pela existência e benemerência dos seus amigos. E eu, também  me esqueci de lhe dizer: “Ainda bem Chico que nas intempéries da vida (na cruz a que carregamos), DEUS tem sempre uma SAÍDA para nos dar. O Aeroporto, enfim tem essa capacidade de nos levar ao esquecimento...

03 – Estão ali no aeroporto várias pessoas com a mesma camisa vermelha e nela um distintivo. A um certo custo me dei conta que ali estava uma delegação do time do Imperatriz, que a torto e direito chamam-no de “CAVALO DE AÇO”. Logo pensei: Vai ver que vai levar mais uma taca, tal o costume. Aí quando me dei por conta, havia nessa turba um sujeito, de boa estatura, também envergado de Cavalo de Aço, com o cabelo recortado tipo “têso” (Têso, linguagem regional que indica um lugar mais alto numa área alagadiça). De brincos nas orelhas. Tanto os brincos quanto os cabelos faziam lembrar um Ipê na florada. De tão amarelinhos que estavam!

Lembrei-me então que o meu amigo WEMERSON GIOVANI, pai do neófito Walleff, que entre outras atribuições é  “pauteiro” de um canal de TV, me disse que deu um pauta para uma equipe  de repórter/cinegrafista fazer uma matéria sobre a FLORADA DO IPÊ. E os tais, para a sua frustração, nada realizaram. Achei a ideia fantástica! Sou fã  da florada do Ipê amarelo e, nos estradões da vida, reflito por ela. Agora mesmo estarei levando CINCO MUDAS de ipês amarelos para a minha terra natal. Taí, WEMERSON, quem não tem cão caça com gato. Se a pauta da  florada do Ipê te resultou em frustração, você até que pode procurar o Pangaré que lá tem um cara em que cabelos e brincos são uma legítima florada do Ipê amarelo. Aproveita!!!

04 – No Aeroporto, havia uma distinta senhora de mediana idade. Ele envergava um vestidão até pouco acima dos pés em cor única. Aquilo, contudo, tal o estilo cônico, me fez lembrar uma ÁRVORE DE NATAL e, numa segunda opção, um CONE de sinalização. Ela dentro daquele vestido “horroroso” esnobava prazer, conversa aberta, falação, espontaneidade. Nisso chega uma amiga de posse e aos braços cálidos, ternos e sublimes com um cachorrinho. Cachorrinho quieto, bem comportado parecia um “bom menino”. E as duas lá, cada qual com o seu bem maior: uma com o seu vestido tipo árvore de Natal (sem enfeites) e a outra com o seu cachorrinho, um declarado e ostensivo AMOR DE SUA VIDA, até que a morte os separe. E eu ali: “O Aeroporto  é lugar de gente esticada”.

05 – No aeroporto, não sei porque, além do meu lado de “questionador do social”, também me dá um tédio. Levei dois livros. Sentei-me a um lugar discreto e me pus a ler, sorvendo a leitura do meu antigo professor na Faculdade, no livro CENAS QUE FICAM. Pura literatura mas... uma lição atrás da outra! Nisso uma senhora ao lado não se desgrudava do seu celular. A cada três minutos como se buscasse uma recomposição de sua postura ao sentar, ela dava uma estocada no banco e aquilo ia refletir na minha cabeça. E nova estocada ao banco, era como se eu levasse um soco. Discreto, resolvi dar o troco. E dei. Logo ela despertou do seu celular. O Aeroporto é lugar de gente esticada.

06. Enfim, é o momento do desembarque e saída dos passageiros. Eles saem como se fosse aberto uma porteira, quase uma revoada. Nada contra. Mas cada qual mais esticado. Afinal o Aeroporto é lugar de gente esticada. Nessa turba, vai ali uma senhora de mediana idade. Pregadíssima ao celular qual aquela outra dos solavancos ao banco. Enquanto ela se concentra e quiçá se diverte ao celular a sua filhinha de aparente dois anos de idade, mesmo sem fazer escândalo, olhos avermelhados, vai atrás chorando. E a mãe à frente, perdida no quanto barafusta ao seu celular. E eu ali, “questionador do social”, observando, lembrando a florada do Ipê, a árvore de Natal, o cachorrinho amado e os desvão da vida, ao tempo eu que eu me convencia: O AEROPORTO É LUGAR DE GENTE ESTICADA.

 * Viegas questiona o social
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