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26/06/2023 às 11h36min - Atualizada em 26/06/2023 às 11h36min

Saneamento: decretos colocam em risco a universalização, diz Instituto Livres

O gestor de projetos do Instituto Livres, Lucas Rodrigueiro, criticou mudanças de prazo e exigências para prestadores de serviços de saneamento, mas afirma que sustação integral pelo Congresso deve ser avaliada com cuidado, devido aos pontos positivos trazidos nos textos.

Fernando Alves
Brasil 61
Foto: Arquivo pessoal

   
O projeto de decreto legislativo (PDL) 98/2023 pretende sustar dispositivos dos decretos do governo federal (11466 e 11467) considerados inconstitucionais e prejudiciais à meta de universalizar os serviços de saneamento básico até 2033, prevista no marco legal do saneamento (Lei 14.026/2020). Aprovado no último dia 3 de maio na Câmara dos Deputados, o PDL 98 agora tramita no Senado, em conjunto com outros três projetos de senadores para sustar os decretos integralmente. O senador Confúcio Moura (MDB-RO) foi designado relator da proposta na Comissão de Serviços de Infraestrutura do Senado. 

O Brasil tem o prazo de 10 anos para levar água potável a 99% da população e acesso à coleta e ao tratamento de esgoto a 90% dos brasileiros, conforme determina o marco legal do saneamento (Lei 14.026/2020). O desafio é grande, já que, hoje, 15,8% não possui abastecimento de água, enquanto 44,2% da população ainda não tem rede de esgoto.

Em entrevista ao portal Brasil 61.com, Lucas Rodrigueiro, gestor de projetos do Instituto Livres, explicou a importância do marco do saneamento e alertou sobre as mudanças feitas à lei por decretos do Executivo. A organização do terceiro setor elaborou uma nota técnica crítica a pontos dos decretos do governo federal que podem prejudicar a universalização. 

Brasil 61: Qual a importância do marco do saneamento básico para o país?

LR: A gente entende que o marco do saneamento tem uma importância fundamental para o Brasil. Ele visa elevar o atendimento da população, tem essa meta de oferecer água potável a 99% dos brasileiros, estender os serviços de coleta e tratamento de esgoto a 90% dos cidadãos até 2033. Então a gente vê isso como algo fundamental. Além disso, a gente vê o novo marco tendo esses objetivos ambientais sustentáveis, uma revitalização de bacias hidrográficas, conservação do meio ambiente, redução de perda de água. Isso também para a gente é importante. A gente entende que a lei promove mais qualidade de vida para a população, estimula a economia e gera empregos. 

Brasil 61: Na avaliação do Instituto Livres, quais os principais pontos abordados no marco regulatório?

LR: A abertura de licitação para prestador de serviços nessa área de saneamento, disponibilização de água potável. possibilidade de formação de bloco de municípios para a contratação coletiva, a criação do Comitê Interministerial de Saneamento Básico para facilitar toda essa alocação de recursos, e nós destacamos também a autonomia da Agência Nacional de Águas para fazer essa regulamentação do setor. 

Brasil 61: Como essas medidas contribuem para a qualidade de vida da população?

LR: Você melhora a assiduidade escolar, você potencializa a qualidade de vida e o convívio familiar. A água potável, o saneamento básico gera tempo para que uma mãe tenha um tempo de qualidade com o filho. Você está reduzindo um tempo em que ela vai buscar água a vários quilômetros de distância da sua casa para um lugar próximo da sua casa. E gera esse tempo para que ela cuide dos filhos, busque uma educação, crie algum negócio, gere renda. A gente está falando de fomentar a economia circular através de hortas, através de quintais produtivos — e isso gera alimento de qualidade, gera alimento saudável, orgânico na mesa. 

Brasil 61: No início de abril, o governo federal editou dois decretos que modificam o marco legal. Quais pontos o senhor destaca em relação a essas alterações?

LR: O Instituto Livres analisa esses decretos com atenção. As mudanças negativas que a gente vê que esses decretos trazem estão relacionadas ao prazo estabelecido para a capacidade econômico-financeira dos prestadores de serviços de saneamento, bem como a possibilidade de inclusão de contratos provisórios ou irregulares no processo de comprovação. A gente entende que essas alterações podem gerar insegurança jurídica e comprometer a qualidade e a eficiência dos serviços prestados. Por outro lado, a gente vê as mudanças positivas que incluem a atribuição de responsabilidade à União para auxiliar as empresas no processo de adaptação do setor, por meio de ações desenvolvidas pelos ministérios do Desenvolvimento Regional e da Economia. Além disso, os decretos também buscam incentivar a participação do setor privado por meio da concessão dos serviços de saneamento, o que pode trazer investimentos e melhorias na infraestrutura. 

Brasil 61: Esses decretos podem prejudicar, de alguma forma, a universalização dos serviços de saneamento?

LR: Nós ficamos temerosos com desvios de recursos e não-entrega dos projetos contratados — o que acarretaria na continuação dos males sociais vividos pela falta de água potável e saneamento básico. Destaco aqui que se faz necessário um processo de austeridade, auditoria e transparência na gestão de cada contrato de serviço. A gente entende isso como algo essencial, porque ficamos realmente temerosos com essa situação. É possível também que haja uma retração de investimentos, qualidade e eficiência dos serviços prestados, vide essa flexibilização e essa inclusão de contratos provisórios e irregulares, até que haja esse processo de comprovação. 

Brasil 61: A Câmara dos Deputados aprovou recentemente o PDL 98/2023, que agora está em análise no Senado. O projeto susta parte dos decretos do Executivo. Qual a opinião do senhor sobre o PDL?
 
LR: Sobre o PDL 98/2023, o Instituto Livres reconhece a importância do debate no Congresso Nacional sobre os decretos e os projetos de decretos legislativos, que buscam sustá-los. A análise desses PDLs, especialmente o 98/2023, é fundamental para avaliar os impactos e os possíveis caminhos para o aprimoramento do marco regulatório do saneamento básico. A possibilidade de sustação integral dos decretos, incluindo os pontos positivos, é uma questão delicada. Deve ser avaliada com cuidado. Embora seja importante corrigir eventuais problemas, incongruências nos decretos, é fundamental garantir que as mudanças positivas sejam preservadas para impulsionar o avanço do setor do saneamento básico. É necessário encontrar um equilíbrio, que permita a modernização e o fortalecimento do setor, estimulando a participação do setor privado, sem comprometer a universalização dos serviços e a garantia do acesso aos mais vulneráveis.
  


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