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08/07/2023 às 00h00min - Atualizada em 08/07/2023 às 00h00min

Caminhos por onde andei

CLEMENTE VIEGAS

CLEMENTE VIEGAS

O Doutor CLEMENTE VIEGAS é advogado, jornalista, cronista e... interpreta e questiona o social.

OS FILHOS DE NINGUÉM

Vejo pelas ruas da vida, por aí, OS FILHOS DE NINGUÉM. E, ainda que eu diga aqui que essas tais criaturas sejam filhas de ninguém, logo busco me redimir porque em verdade eles são filhos de alguém. E então vejo aquele que anda “zanzando”, tombando por aí, até parece que vive bêbado 24 horas por dia.

Fala entre solto e atropelado. A ideia lógica que se tem é de que a sobriedade passa longe, mas, por vezes, quando se faz por perto, ele se oferece em pequenos serviços à espreita de algumas moedas que contribuam para o seu vício ou, quem sabe, para o seu de comer. É um vício que vem de família. Dizem que vem do seu pai. Seu pai era um alcoólatra em tempo integral. Seu irmão era mesmo assim. Bêbado em tempo inteiro. O outro irmão também assim: Também bêbado o tempo todo.

Agora, imaginemos uma família em os filhos (homens) se fazem entregues ao vício alcoólico. Ainda por cima tem dois ou três vizinhos que, misturados ao alcoolismo também se servem de outras drogas. E assim vão vivendo esses filhos de ninguém. Lá adiante tem aquela outra. Vive pedindo a um e a outro. Chama-os de “papai” e de “mamãe”. Faz isso vestida de simpatia e “amabilidades”, sempre de mão esticada e malandrinha à espera de algum dinheiro para sustentar a vida amassada e esfarrapada que leva.

Costumava aparecer gestante. Paria, até. E o que fazia com os filhos? Não se sabe ao certo. Sabe-se apenas que não tem quaisquer deles. Todos que foram entregues ao “deus-dará” e, quem sabe, levarão em diante as tormentas do social a que foram submetidos, ainda que durante a gravidez.

Em meio aos filhos de ninguém, havia aquele outro que ao dirigir-se fosse a quem fosse, já se auto apresentava carente e homem de rua. Até parece que a sua senha não deu certo. Sempre que se dirigia às pessoas  com o seu refrão, as pessoas o evitavam ainda mais. Esse filho de ninguém, acabou desaparecendo da multidão na Região de Fátima, por aonde perambulava; ele que vinha das bandas da beira-rio.  Certo dia, ele se dirigiu a mim, aos gritos, com a segurança de que se sentia: “me dê cinco reais aí, que é para mim comprar duas pedras”.

Perambula por aí um filho de ninguém. Ele é musculoso e forte. Dá uma ideia de quem respira certa saúde. Fala sozinho por aonde vai. E caminha determinado, decidido, como quem sabe o que quer. Costuma caminhar lado a lado ou em sentido contrário aos carros. Ele passa a ideia de quem por si só é um risco. Melhor não incomodá-lo. Se pegar um desavisado, ele vai moer o cara, triturar o cara. Melhor é não contrariá-lo, em nada.

Aqui no setor da União, tem um filho de ninguém que vive na rua em tempo inteiro. Visivelmente doente, ele come ou bebe quando lhe dão; se lhe dão. Indesejável, é expulso onde se acoita para escapar da chuva ou do pleno relento, tal o malgrado do ambiente que deixa. Ele tem sempre à mão uma pequena vasilha de cachaça. Deve  ser o seu alento para a vida que leva ao relento, esse filho de ninguém.

Aquele outro, filho de ninguém, é um “ceguinho”. Ela vagueia pelas ruas da vida, à espera, quem sabe, de  quem lhe estenda um trocado. Ele carrega a sua caneca de beber,  pendurada  à cinta para os momentos da precisão. Ele é mais um que compõe a falange dos filhos de ninguém que infestam a cidade.

Aquele outro é um rapagão. Em princípio, faz algum tempo, andava mais alinhado. Por último entregou-se à rua; abandonou-se de si mesmo. Barbudo, rasgado e sujo é como anda, carregando sempre um saco às costas. E se antes dava uma ideia de que tinha um lugar para dormir, agora parece que não tem mais esse lugar. Transmite a ideia de quem tem força e disposição, esse filho de ninguém.
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