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23/09/2023 às 10h04min - Atualizada em 23/09/2023 às 10h04min

Campanha busca aumentar número de doadores de órgãos. Mais de 66 mil aguardam transplantes

27 de setembro — Dia Nacional da Doação de Órgãos. A data serve para incentivar, promover e esclarecer à população sobre a importância de expressar a vontade de ser um doador

Lívia Braz
Brasil 61
No Brasil, busca maior é por doadores de rins - Foto: Elza Fiuza/Agência Brasil

   
Rim, fígado, coração, pâncreas, pulmão e córnea. A lista de transplantes no país tem hoje 66 mil pacientes à espera de algum ou mais de um desses órgãos. Pessoas que dependem da doação e do esclarecimento de outros para continuarem vivendo, ou tendo mais qualidade de vida. 

O transplante de órgãos no Brasil hoje só acontece quando a família do doador permite a doação, como explica a coordenadora-geral do Sistema Nacional de Transplantes (SNT) do Ministério da Saúde, Daniela Salomão.

“A doação no Brasil hoje é do modelo consentido. Ou seja, você só é doador se sua família autorizar o consentimento da doação. Então, no momento do nosso falecimento, a família é entrevistada e opta ou não pela autorização da doação. E é a única forma de nos tornarmos doadores hoje.”

Por isso, o “setembro verde” é o mês dedicado à conscientização da doação. Para que a informação chegue ao maior número de pessoas e essa fila, que ultrapassa os 66 mil, possa diminuir. Mas não é só a vontade de doar que decide o futuro de um transplante. Há critérios como: compatibilidade sanguínea, tipo físico e até a distância entre doador e paciente podem definir quem receberá um órgão doado.

O rim no topo da lista

De acordo com o levantamento diário feito pelo Ministério da Saúde, até o dia 21 de setembro deste ano, 37.281 pessoas esperavam por um rim no Brasil. O estado de São Paulo lidera com mais pacientes, 19.658. Por outro lado, também é o órgão mais transplantado, foram 4.206 cirurgias desse tipo só em 2023.

A médica nefrologista e especialista em transplante renal Rubia Boaretto, de Cascavel, no Paraná, explica as principais causas da falência renal — motivo que leva as pessoas à diálise e que tem o transplante como solução — na maioria dos casos.

“Doenças como diabetes de hipertensão — que podem ser tratadas — mas passam muito tempo sem diagnóstico e manejo correto, levando à perda do órgão. Além da falta de informação a respeito das doenças renais, que passam assintomáticas. E o fato de a população estar envelhecendo, esse tempo de acometimento que lesam o rim é cada vez maior. E o envelhecimento, por si só, contribui para a doença renal.” 

Segundo a médica, “as chances de uma vida normal após o transplante são de 100%. Há uma recuperação na qualidade de vida exponencial e as taxas de mortalidade são muito menores quando se transplanta em comparação com os pacientes que ficam na diálise — seja na hemodiálise ou na diálise peritoneal.”   

O paciente transplantado ainda consegue ter melhorias em:

  • menos fraqueza, cansaço e indisposição;
  • reversão completa da anemia;
  • controle do balanço hídrico — paciente consegue beber líquidos à vontade;
  • equilíbrio hormonal e melhoria da qualidade sexual;
  • liberdade para viajar e ter uma vida normal.

Luz no fim da fila 

Em 2021, a cantora brasiliense Simone Ribeiro, na época com 51 anos, usava lentes de contato para corrigir uma grave miopia. Como costumava dormir com as lentes e não fazia a higiene correta, acabou pegando uma bactéria e — em poucos dias — desenvolveu uma úlcera na córnea que culminou na perda da visão. 

Foram vários meses de tratamento com antibióticos fortíssimos, até que a lesão fosse curada e ela pudesse, então, entrar na fila do transplante para ter uma chance de voltar a enxergar. Em novembro do ano passado, Simone foi inscrita na lista e, desde então, espera pelo órgão.

“A minha expectativa é que eu não tenha rejeição e que eu consiga enxergar pelo menos 80% do olho direito, já que hoje não enxergo nada dele.”

Segundo a médica oftalmologista do hospital CBV de Brasília Fabiola Gavioli, apesar da maior parte dos transplantes serem bem sucedidos e devolver a visão ao paciente enxertado, ainda existe um índice de rejeição.  

“A córnea é um tecido, por isso ela traz consigo algumas informações genéticas do doador. E ela tem um índice de rejeição de 15%, considerado um índice pequeno. Como não tem sangue, é um índice de rejeição menor que outros órgãos, como fígado e rins, por exemplo.”

Hoje, 245 pessoas estão na frente de Simone na lista para receber o órgão. Segundo ela, todos os exames pré-operatórios já foram feitos, mas ela imagina que só deve receber o novo órgão dentro de um ano. E teme ficar sem enxergar também do olho sadio, já que o grau é alto e tende a aumentar ainda mais com o avançar da idade. 

“Eu parei de trabalhar na música porque não estava enxergando as letras. Hoje eu só enxergo com o olho esquerdo, mas ele está com uma lente de 10 graus e o médico falou que a tendência é aumentar, devido à minha idade.”

Córnea: fila grande apesar de menos critérios

A lista de espera por uma córnea soma 25.945 pessoas. Segundo a oftalmologista Fabíola Gavioli, para doar a córnea não é necessário ter compatibilidade sanguínea, de idade, física, “porque o que a gente leva em consideração é a avaliação do tecido, a quantidade de células, a vitalidade que ela tem.” 

“Eu posso ter uma córnea jovem, mas que já está bastante comprometida no momento da doação, ou posso ter uma córnea de 60 anos, mas que está ótima. É legal isso da córnea justamente porque a quantidade de pessoas que podem ser doadoras é muito maior.” 

Além disso, um doador pode beneficiar dois pacientes. Apesar da maior facilidade na doação nesse órgão, de acordo com dados do Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO), entre 2019 e 2022, o número de pacientes aguardando o órgão duplicou, passando de 12.212 para 24.319. 

Segundo a oftalmologista, a pandemia agravou esse aumento, já que “durante todo o ano de 2020 ficamos sem receber o órgão e sem fazer as cirurgias, porque sabíamos muito pouco sobre a COVID.” 

O Ministério da Saúde confirma que a pandemia atrasou a fila de doação e de cirurgias de transplantes, mas segundo a coordenadora-geral do SNT, tudo já foi normalizado. 

“A pandemia impactou negativamente no número de doadores por conta de a maioria dos pacientes que estavam em UTIs, estavam lá por causa da Covid. E como naquele momento não se entendia direito a forma de contágio, por isso o paciente com Covid não podia ser doador — o que gerou uma diminuição do número de possibilidades de doação.”

De janeiro até hoje, segundo o Ministério da Saúde, foram feitas 11.274 cirurgias de transplante de córnea no Brasil, a maioria, 4.230 no estado de São Paulo. 
  


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