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09/04/2021 às 20h00min - Atualizada em 09/04/2021 às 20h00min

LUAR E PESCARIA

(Em memória do Mestre Zuza, meu pai, nascido em abril de 1932)

Elson Araújo
Não sei pescar, é verdade! Nunca quis aprender, mesmo tendo a oportunidade com meu saudoso e polivalente pai, o mestre Zuza. Ele, de um tudo sabia fazer um pouco, e pescar era um desse tudo. Não gostava de anzol, preferia mesmo a tarrafa que ele mesmo fazia.  Aprendeu a tecer a “malha” com minha avó Inês, que também o ensinou a criar com Palha de coco babaçu, côfo, abano, quibane e esteira. Minha avó também era polivalente, criou onze filhos, meu pai era o mais velho. 

Sempre que era possível acompanhava meu pai nas pescarias pelos beirais do Rio Tocantins, num tempo em que o lajeiro ainda não era tão chagado pela derrama de esgoto in natura, nem base para usuários de drogas. O perigo, de verdade, era deslizar e levar uma queda daquelas, ou então perder o equilíbrio pisando num tracajá, quelônio, naquele tempo muito abundante por ali. Fora disso, era só não se afoitar que tudo fluía e terminava bem.

Era bonito demais ver meu pai lançar a tarrafa no ar, principalmente quando a pescaria coincidia com noite de lua cheia. Com o Céu iluminado, a lanterna, daquelas de três carregos, raramente era ligada. Meu pai era muito bom naquilo. O instrumento caia na água sempre aberta, e com muita perfeição. 

Chuaaaaaaa!!!!! Até o barulho da queda da rede na água se fazia belo. Era música para mim, pequeno infante.  Depois do lance, ele puxava o equipamento com todo cuidado para nenhum pescado escapar. Às vezes a tarrafa enganchava e eu, com a água na cintura, morrendo de medo {como disse não sabia nadar} ia ajudá-lo com um pé dentro e outro fora da água. Na verdade, a ajuda era meramente moral, era só para dizer mesmo. 

O cenário - rio/lua cheia ficava mais belo ainda quando, apanhadas, as prateadas sardinhas e branquinhas faziam um esforço danado para escapar da malha. Com a luz do luar elas pareciam estrelas suspensas no ar, a iluminar a noite. Vez por outra fazia companhia a elas alguns mandis, piaus, corvinas e até, o hoje quase extinto, bico de pato. 

Só quem não gostava dessa brincadeira toda era minha mãe, Tereza. Fazia um peixe como ninguém, mas na hora de limpar o resultado da pescaria ela pulava fora. 

-“Quer comer, trate-os’-  dizia mamãe com o rosto franzido. Na verdade, não dava para ter certeza se ela estava falando sério ou brincando, mas   não tinha problema; a limpeza ficava mesmo com meu pai que sabia que a recompensa viria horas depois com a família reunida saboreando a caldeirada temperada e preparada com amor pela dona Tereza, tarefa essa que nem obrigada transferia para outrem.
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