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10/10/2020 às 00h00min - Atualizada em 10/10/2020 às 00h00min

Um general no Supremo Tribunal

AURELIANO NETO

AURELIANO NETO

Doutor Manoel AURELIANO Ferreira NETO é magistrado aposentado do Tribunal de Justiça do Maranhão.

 

Não se trata da personagem do escritor colombiano Gabriel García Márquez, construído no seu admirável romance O General em seu Labirinto, no qual o prêmio Nobel de literatura ficciona sobre as angústias dos últimos dias de vida de José Antonio de la Santísima Trinidad Simón Bolívar y Palacios, historicamente conhecido como Simón Bolívar, El Libertado. Aqui já não se especula no mundo da ficção literária, embora, num equívoco, se caia nessa burlesca tentação. Até porque o general não está vivendo o tormento do seu labirinto pessoal, mas numa perspectiva, quem sabe viável, e bem viável, de ser, em face do seu saber estratégico e logístico, elevado a Ministro do Supremo Tribunal Federal.

Impõe-me a ética da responsabilidade de esclarecer aos menos informados (e há muitos!) que essa ideia especulativa não se originou da minha consumida massa cefálica. Tudo decorreu dos notórios acontecimentos atuais, historicamente contemporâneos. Vejamos: temos um general, que cumpre ordens e não cria problemas de qualquer natureza, como Ministro da Saúde. E, por tudo isso, a pandemia tem agradecido por continuar a sua caminhada destrutiva. Apenas tendo que lutar contra o bom combate dos governadores. No Ministério da Educação, está alojado um pastor de uma dessas seitas protestantes. Nada contra. Poderia ser um babalorixá e tudo estaria no seu lugar, graças a Deus, como exalta o cancioneiro popular. Há, dizem, sem contestação, que mais de três mil postos são ocupados, na famosa Esplanada, por generais, coronéis, capitães e etc. Ah!, ia esquecendo, ainda se tem a citadíssima Damares num dos ministérios que trata de questões referentes a direitos humanos. É uma dessas evangélicas PhD emperdenidas. Pensei que o padre Robson, recentemente inocentado de graves acusações, tivesse uma vezinha no rol dessas dignificantes atividades públicas. Mas... A pregação dele é em outros labirintos. Ainda não acumulou quantidade suficiente de voto de cabresto.

Outros motivos, e são muitos, que me levaram a esta especulação, se originaram de alguns fatos que marcaram a indicação do substituto do Ministro Celso de Mello, que culminou na escolha do Desembargador Kássio Nunes, embora inexistente a vaga (quando escrevo estas linhas), pois a aposentadoria ainda está a se concretizar. Pois bem: primeiramente, o candidato era o Moro, que prestara um “excelente” (entre aspas) serviço à direita conservadora, com efeitos eleitorais devastadores. Moro, que misturou exercício de jurisdição com atividade política, caiu feio do cavalo. De ídolo da plebe ignara passou à condição de Judas. Já está a caminho dos Estados Unidos, para servir a Trump, essa figura grotesca que mais parece palhaço do antigo circo Garcia, só que sem nenhuma graça. Depois, o preferido era Aras, procurador geral escolhido sem atender a lista democrática do MPF. Ficou no tatibitate. Aí foi cancelado pelos interesses do sistema. Apesar de tudo, sob os protestos do famigerado Malafaia, resta indicar um evangélico daqueles totalmente e inarredavelmente evangélicos. Pode ser, nada contra.

Mas, lendo a coluna de Moisés Mendes, publicada no site brasil247, do dia 6, a conclusão que chego é que, para evitar qualquer inócua discussão, a próxima indicação deve consagrar a figura de um general. Ora, pois, já temos general vice-presidente, general ministro, por que não ter um general no Supremo Tribunal Federal? No regime ditatorial de 64, não se chegou a tanto, até porque os presidentes não tinham filhos envolvidos em rachadinha, ou mulheres que recebiam em sua conta depósito de valores inexplicáveis de algum ou qualquer Queiroz. É certo que militares ocuparam postos relevantes, como Passarinho, Golbery, Andreazza e tantos e tantos outros. Mas, justifica-se, era a ditadura. Um sargento, dependendo da localidade, poderia valer um coronel. E vai por aí afora.

Bem. Vamos ao exame da legalidade constitucional. Já andam dizendo por aí e está na Constituição Federal, conforme alerta o citado colunista, que, para ser ministro do Supremo, não precisa ser advogado, juiz ou promotor. Não precisa nem ter diploma superior. A única exigência é provar ter notório saber jurídico. Esse requisito consta no art. 101, caput, da Constituição da República brasileira. A nomeação do indicado é procedida por um ato complexo. O presidente da República faz a escolha e Senado, por maioria, aprova, e, em seguida, é feita a nomeação. Desse modo, fácil deduzir-se que a escolha e nomeação são bem singelas, uma vez que o nosso (ou deles) Senado sempre cumpre as ordens deles e não nossa, embora eleitos os senadores por nós.

Se o general demonstrar notório saber jurídico, a questão está resolvida e o teremos na Corte Suprema decidindo sobre os nossos destinos constitucionais, ainda com direito à reverência a bandeiro e, antes das sessões de julgamento, cantar-se o hino nacional. Aguardemos a futura aposentadoria do Ministro Marco Aurélio.

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