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12/11/2022 às 00h00min - Atualizada em 12/11/2022 às 00h00min

Depois da tempestade, vem a bonança. Será?

AURELIANO NETO

AURELIANO NETO

Doutor Manoel AURELIANO Ferreira NETO é magistrado aposentado do Tribunal de Justiça do Maranhão, e membro da AML e AIL - [email protected]

 
Pode ser que sim. E tudo nos leva a crer que sim. Mas, como diz Machado de Assis, a verdade é essa, sem ser bem essa. Nem sempre esse axioma se transmuda no mundo social numa verdade. A chuva cai, o sol surge no horizonte, projetando um arco-íris. Pode-se ter a quietude. Porém a chuva forte, com o aguaceiro destruidor, pode contaminar essa possibilidade de bonança, pelos transtornos deixados pela sua passagem. E bonança desaparece na luta em fazer a vida voltar a ser como antes. Mesmo assim, acredito nessa possibilidade de, passada a tempestade, venha a se viver a calmaria da bonança, sobretudo quando os fatores que dão origem ao sofrimento físico ou espiritual podem ser superados.

Há um pensador, Deniane Diniz Rodrigues, para mim até então desconhecido, que amplia essa concepção que já nos acompanha por alguns anos, travestindo-se numa quase verdade. O que diz esse pensador: “Depois da luta vem a vitória, depois da tempestade a bonança, depois da humilhação a exaltação, depois da tristeza a alegria, depois do choro o lindo canto de vitória, pois não há mal que dure para sempre e a alegria do Senhor se torna a nossa força a cada amanhecer...” Estabelece-se, como se deduz das fórmulas fraseadas, uma espécie de dialetização entre o antes e que vem depois, numa verdadeira ditadura do relativismo, com pouca densidade científica. Isso porque nem sempre depois de um fato negativo vem um positivo, para compensar os transtornos íntimos ou físicos que ocorreram.

Para compreender-se a sociedade é necessário vivermos todos os dramas positivos e negativos, decorrentes da vida social. Nós, seres humanos, enquanto seres humanos, temos um compromisso, isso em qualquer atividade que estivermos exercendo, com a sociedade: fazer o bem. A nossa liberdade está condicionada a essa convivência com o outro. Como amá-lo, como tratá-lo e como respeitar a sua dignidade como ser humano, criatura de Deus, independentemente de cor, sexo, religião, statu econômico (rico, pobre ou miserável), ou ainda de ter ou não ter alguma ideologia.

Por acaso, encontro-me a ler um psicanalista, Noberto Keppe, e a sua obra é Escravidão e Liberdade. Sobre o exercício da liberdade, ele faz a seguinte anotação: “A liberdade faz parte da essência da criação, ou melhor, o ser humano não ser senão livre – agora, temos de conhecer exatamente o que é liberdade – e o primeiro elemento que nos surge, é que o bem, o belo e o verdadeiro constituem a essência da vida. Toda vez que somos impedidos de viver o bem, o belo e o verdadeiro, tornamo-nos escravos, pois aí sofreemos uma coartação.” Disso se deduz que viver o ódio e realizar ações, assentadas em concepções mentirosas (denominadas de fakes), é não exercer a liberdade, por ser ato de escravização, sobretudo quando a prática é em nome do Senhor. Mas quem mesmo é esse Senhor? Será Deus mesmo? Ou seria Lúcifer? como chegam a afirmar certas seitas religiosas, que valorizam mais as ações do mal do segundo, em detrimento do amor que Deus tem por nós.

Não há dúvida de que, lembrando Thomas Hobbes, o homem é lobo para o outro homem, assim como, conforme afirmou Jean Jacques Rousseau, no Contrato Social, o ser humano nasce bom e a sociedade o perverte. Mas, quanto a esta última tese principiológica de Rousseau, Keppe, acima citado, na mesma obra, faz essa assertiva, dando outro sentido ao que disse o filósofo de Genebra: “A sociedade em si é boa, e só deixa de ser assim depois que é deformada, negada ou omitida em sua realidade – e não podemos nos esquecer que ela constantemente sofre a ação ruim dos indivíduos patológicos que alcançam o poder.”

Chegamos à bonança? Não. Se a sociedade é boa, sendo deturpada pelo ser humano, ou se o homem nasce bom e é pervertido pela sociedade, o certo é que o que se constata nesta terra brasilis é que a deformação social decorre dos atos praticados por aqueles que perderam a batalha eleitoral. No Paraná, a mãe enxotou o filho de casa. E lhe disse: “Você já não é mais bem-vindo”. Em Jundiaí, SP, a escola foi obrigada a fechar, para evitar ataques de agressivos perdedores da eleição presidencial. Em Santa Catarina, reduto das grandes fortunas capitalistas, o ministro do STF, Luís Barroso, foi assedia física e moralmente por manifestantes, ficando impossibilitado de sair de restaurante, em Porto Belo. E o pior da deformação social: em Minas, um policial militar enforca uma criança de seis anos, por ter dito palavra de apoio ao presidente eleito. Enforcou-o, com requinte de crueldade de um carrasco-torturador dos tempos atuais, sob o estigma do ódio, que a criança perdeu o fôlego e desmaiou. Por último, um militante de direita, conhecido por Rafão, fez esta nazista declaração, que nada tem a ver com Deus, ou com Cristo: “Deveria ter logo matado assim um animal a menor no mundo” (sic). E mais ainda: vale registrar a insistência idiota e criminosa de um movimento psicopatológico, objetivando intervenção militar. São os adoradores do Faraó. Bajuladores dos quartéis. Mas, depois, na hora de derrubar o regime autoritário, não saem de casa, ficam escondidinho no banheiro ou no sótão de suas mansões. Ou vão gastar os seus dólares em algum exótico país do exterior. É sempre assim, desde a república velha até os nossos tempos.

* Membro da AML e AIL
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