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16/07/2022 às 00h00min - Atualizada em 16/07/2022 às 00h00min

Pátria Amada – a barbárie de todos os dias

AURELIANO NETO

AURELIANO NETO

Doutor Manoel AURELIANO Ferreira NETO é magistrado aposentado do Tribunal de Justiça do Maranhão, e membro da AML e AIL - [email protected]

 
Eu me armo, tu te armas, ele se arma, nós nos armamos, vós vos armais e todos se armam. Assim fez o terrorista Jorge José da Rocha Guaranho. Armado, sendo um refinado estilista na arte de matar, mirou na cabecinha do seu suposto e figadal inimigo, deu-lhe um certeiro tiro e o matou. Executa Guaranho a política social, econômica e armamentista do governo da nossa vilipendiada Pátria Amada. E as águas da Foz do Iguaçu se coloriram de vermelho, um vermelho sanguíneo, lamentado por muitos que têm algum resquício de amor ao próximo e adorado pelos adoradores da morte. O atual chefe da Pátria Amada e pregoeiro dessas atrocidades, em mensagem de puro ódio, própria do seu perfil, de pouquíssimo ou nenhum estudo, declarou que essa violência (ainda bem, violência) é característica da esquerda. Deve ser a que apertou o gatilho da pistola calibre 40.

Após tomar conhecimento desse hediondo assassinato, um retrato vivo de práticas nazistas, em que os seguidores de Hitler incendiavam casas, lojas e sinagogas dos judeus, torturavam e matavam, sob a aquiescência conformista dos alemães não judeus, integrantes da classe média e alta, fui dar uma olhada, de passagem, nas notícias, e o que encontrei? Bem. Nada que me causasse surpresa. Pelo contrário, apenas o óbvio da indiferença. Transcrevo: “Houve diferentes reações da classe política. O presidente Bolsonaro fez um discurso pró-armas a apoiadores, enquanto o vice-presidente Hamilton Mourão minimizou e disse que casos como esse acontecem ‘todo fim de semana’. Arthur Lira, presidente da Câmara, afirmou que a casa repudia a violência decorrente de manifestações políticas.” Ainda bem, seu Arthur, já que o vice, que, por ser general, se presume que tenha lido e estudado alguns livrinhos, justificou a monstruosidade transformando a hedionda barbárie, a moda terrorista, num fato corriqueiro do caos nosso de cada dia, na expressão utilizada no passado recente pelo cronista Carlos Eduardo Novaes.

Mas, tenho pensado, se as armas deixarem, a vida continua. Até quando, é difícil saber. Os estudiosos – e há felizmente ainda quem estude nessa nossa conturbada Pátria Amada – têm demonstrado a incompetência absoluta dos militares, de patente rasa ou de escalão elevado, para o diálogo e exercer um governo que se fundamente numa democracia constitucional. O historiador britânico Niall Ferguson, citado por José Luís Fiori e William Nozaki, em estudo publicado no site Brasil 247, ao defender essa tese, aponta algumas razões que decorrem da própria vida e da formação de caserna, muito estreita, centrada na hierarquia e na disciplina, que nada tem a ver com a atividade de governar, onde o fazer política exige diálogo. Os governos democráticos, portanto, firmados nessa dialeticidade, sem imposição de ordem unida e etc., buscam construir uma sociedade mais aberta a discutir as suas questões mais polêmicas, de forma democrática, sem ortodoxia ou perseguição. O pensar, para esse exercício, é plural. E isso requer abertura, que não se subsume à linha rígida de quartel.

Daí os autores acima citados (Luís Fiori e William Nozaki) levantarem essa fundamental questão: “Qualquer pessoa de bom-senso – dentro e fora do Brasil – se pergunta hoje como foi que um segmento importante dos militares brasileiros chegou ao ponto de conceber e levar adiante um governo militarizado e aliado a grupos e pessoas movidas por um reacionarismo religioso extremado, e por um fanatismo econômico e ideológico completamente ultrapassados, todos ‘escondidos’ atrás de um personagem grotesco e um ‘mau militar’, como afirmou o general Ernesto Geisel em outro momento?”

Não há resposta, a não ser em razão do exercício paralelo de cargos públicos eminentemente civis, ocupados na Esplanada por militares das mais variadas graduações. Não se trata, nem há que se crer, de conflito entre esquerda e direita, ou de comunismo e capitalismo. O capitalismo continua vigoroso, com os seus tentáculos se estendendo para todos os lados. Os lucros das instituições financeiras, as quais não geram nenhum emprego, estão cada vez mais elevados. Nessa trilha, seguem os grandes e majestosos grupos econômicos internacionais. O comunismo, como ideologia aplicada, não existe mais. A China é um Estado autocrata, capitalista. Lá, se já ouviram falar de Marx, esqueceram. A Rússia, após 1989, entrou em declínio, tendo na sua sombra, com o fim da União Soviética, outras potências que vêm ressurgindo das cinzas da quebradeira comunista.

No Brasil, se há uma velada intenção de golpe, mantendo esse culto a uma pessoa de pouquíssimos recursos mentais, qual a finalidade? Tirar o povo brasileiro, desta Pátria Amada, da situação de fome e miséria em que encontra? Continuar matando os favelados, como profilaxia da criminalidade? Ou entregar o país para aves de rapina, na expressão por Getúlio Vargas, na Carta Testamento? Vamos pensar sobre essas questões, se quisermos, independentemente de continência ou ordem unidade, amar, com absoluta convicção e responsabilidade, a nossa pátria.

* Membro da AML e AIL
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