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19/09/2020 às 00h00min - Atualizada em 19/09/2020 às 00h00min

Entre a praça e a praia

CLEMENTE VIEGAS

CLEMENTE VIEGAS

O Doutor CLEMENTE VIEGAS é advogado, jornalista, cronista e... interpreta e questiona o social.


( NOTA DO AUTOR: Texto com o título original ENTRE A PRAÇA JOÃO LISBOA E AS AREIAS DA PONTA D’AREIA, foi  criado para a crônica PÁGINA DE SAUDADE, no rádio, ainda inédita , ampliado e adaptado para  estes ...CAMINHOR POR ONDE ANDEI.  A PÁGINA DE SAUDADE está no ar na Rádio Mirante/AM, no Programa CLUBE DA SAUDADE, ininterrupta, desde julho de 2007, faz mais de 13 anos, sempre aos domingos, às oito da manhã que, por estas bandas só poderá ser ouvida pela internet. 

A crônica, no rádio, deixou de ser um simples quadro para tornar-se um ESPETÁCULO, tal o conjunto da obra composto do texto, seguido de uma ou duas música/s que expressa/m a matéria em abordagem. Você, leitor, me daria a honra da audiência no rádio, pela internet)
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Nas minhas levianas divagações, eu gostaria de ter uma praça para chamar de minha. E então a Praça João Lisboa na capital é a minha praça. De velhos tempos, para mim, a Praça João Lisboa era a capital e a capital era a praça. Ali a um tempo era o caminho das minhas tantas idas e vindas - terreiro da minha intimidade. Velho tempo, belos dias!!!

João Lisboa do Abrigo Novo e do Abrigo Velho; das lanchonetes, dos cafezinhos e do caldo de cana que existiam por lá. Abrigos que serviam de entreposto, parada e logística ao transporte dos bondes elétricos, da capital. Praça João Lisboa  do Salão Pompeu, depois Pompeuzinho; da Igreja do Carmo, do Hotel Ribamar. João Lisboa que dá pro Beco da Pacotilha. Delvi o alfaiate – pertinho de lá. Correios, Lítero, Teatro, Banco Real, tudo isso me faz lembrar.

João Lisboa do SENADINHO. Lembra do SENADINHO da João Lisboa? O papo era política - numa boa!  Da João Lisboa sai pra Rua de Nazaré, naquela esquina, numa tarde o Jornalista Othelino tombou na bala. A um passo da Benedito Leite e logo ali o  velho CENTRO CAIXEIRAL. Olhar para o LORD HOTEL  e logo ali o Bar do Hotel Central, cujo calçadão era o ponto de encontro dos políticos e comerciantes do interior e outros tantos por lá, sorvendo a leveza e a brisa que vem do mar.

Da João Lisboa e num simples olhar, cartão de saudades era e FERRO DE ENGOMAR! Noutra direção, sai pra Magalhães de Almeida rumo às Cajazeiras e Mercado Central. Nesse mesmo ponto da João Lisboa, desce pela Afonso Pena, passa pela antiga ACADEMIA DO COMÉRCIO e logo ali o JORNAL PEQUENO do velho Bogéa. Jornal Pequeno uma antiga página da minha gratidão e das minhas primeiras publicações.
Aí dava uma quebra de asa (como se dizia) e ia “curtir” na ZONA – um território de todas as gentes, de todas as cores: Empresários, diretores, jornalistas, professores E que atire a primeira pedra quem por lá não teve os seus amores - com registros de casamentos pelo resto da vida.  Hoje a ZONA não existe mais...   quer dizer:  EXISTE AINDA MAIS - está em todos os lugares... nas ruas, no centro, nos bairros, nos colégios, nas repartições e algo mais. Os tempos mudaram... a ZONA também mudou... ... mudou de lugar.

Foi num romântico  fim de tarde em dia de sábado que naquela confluência da João Lisboa com a Rua Grande, que pelas casualidades da vida encontrei-me com um  EX-AMOR. Encontro com ex-amor, você sabe!: Tem panos pras mangas; tem carne pra comer, tem papo pra pôr em dia, tem quarto desarrumado; tem lágrimas guardadas; tanta coisa que ficou para trás – tudo isso e algo mais. Aí... veio aquela declaração  boba: “Tô te vendo só a lembrança, só a saudade; quero te ver em carne e osso”, seguido de uma pergunta também boba porém um tanto agressiva: E aí? Como e quando eu te vejo em carne e osso?  - AMANHÃ, dez horas NA PRAIA DA PONTA DA AREIA, foi  uma fulminante resposta!

Na época eu tinha um FUSCA AZUL zeradão! Fusca azul ali perto estacionado, falou algo  baixinho. E eu que o conhecia como a palma da minha mão, fiz a leitura labial: “legal”, positivo”, “manda ver”. “Tô contigo e não abro” Logo ele malandro e safado todo! Amava uma praia e gostava da gandaia. E não podia ver um rabo de saia. Passava uma rasteira, jogava a rede e exclamava: “Tomara que caia!!!”
A noite daquela noite quaaaase não passa. No dia seguinte não deu outra: Fusca Azul e eu estávamos lá! Nas areias na praia da Ponta D’Areia!!!  Fusca azul, meu companheiro fiel e confidente em todas as “empreitadas”. E, no galanteio, vendo aquela sereia coberta apenas por um minúsculo biquíni e o corpaço desnudado,  antecipou-se e recebeu-a com uma frase: “Carambas, você está mais beeeela do que nunca”, disse quase surrando. Era a provocação, a corte, os cumprimentos... ... ...

Aí fomos pras ondas no mar...  Em seguida um drinque para dosar, mais outro drinque pra calibrar.  Depois de tantas ondas  numa prévia e, como ninguém é de ferro, a gente sem mais nem menos pegou a orla da praia, e a uma milha de distância, quando nos demos por conta estávamos no DESERTO DA PRAIA (numa praia deserta). Nas areias da praia deserta, atentos ao mundo em volta: dali não vem ninguém, dali também não vem...  E, nas areias da praia... as marcas do que se foi...

O sol mais brando no infinito, já fazia a curva no horizonte. Era hora de voltar. Corpos extenuados, cansados e descansados, olhares apagados. Difícil  na caminhada foi chegar lá.  E quando chegamos lá, FUSCA  AZUL me/nos recebeu com a alegria e emoção de quem vê o seu barco voltando. E, carnívoro como sempre foi, porém romântico nas horas vagas, lembrou como da canção: “Quero a alegria de um barco voltando / Quero a ternura de mãos se encontrando”. Eu ainda pude rever e conferir aquelecorpaço, coberto por apenas um minúsculo biquíni! E então eu, atravessados na garganta pela PARTIDA que ali se fazia, saímos cada qual para o seu lado.

E foi a última vez (a última vez) que vi e ouvi o cantar e o amar daquela sereia. O enredo desse encontro dá um livro, um “romance” que guardo na estante  do silêncio das minhas lembranças tantas. Título da obra: “O sol, o Céu e o Mar por Testemunhas”. Uma obra que teve origem a partir de um encontro na Praça João Lisboa  e que se escreveu no deserto das areia da Praia da Ponta D’Areia.  
E agora, como numa antiga fotografia em preto branco, desbotada pelo tempo, feita de imagens entre a Praça João Lisboa e as areias da Praia da Ponta D’areia, é como vou revelando esta...  ...PÁGINA DE SAUDADE.
 
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