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15/04/2022 às 00h00min - Atualizada em 15/04/2022 às 00h00min

TÁ RUÇO!

AURELIANO NETO

AURELIANO NETO

Doutor Manoel AURELIANO Ferreira NETO é magistrado do Tribunal de Justiça do Maranhão

 
De início, sem qualquer estigma de preconceito, é impositivo perguntar-se a si mesmo se a situação tá ruça ou russa? Antes de entrarmos nessa polêmica – aliás, nem tanto polêmica, até porque as pessoas estão se habituando ao silêncio doentio do conformismo -, quero, sem nenhum resquício de vaidade, ou algo parecido, dizer que iniciei a leitura de um livro (de bolso, assim o chamávamos, quando fui revisor das Edições de Ouro, nos anos 70), cujo título é Topologia da violência, em que a primeira frase me despertou uma obsessão provocativa de continuar lendo-o. A frase é: “Há coisas que não desaparecem; dentre elas está a violência.” Na sequência, o autor, Byung-chul Han, faz esta grave advertência: “Hoje ela se retira para espaços subcutâneos, subcomunicativos, capilares e neuronais, adotando uma forma microfísica, que pode ser exercida até mesmo sem a negatividade do domínio ou da inimizade.” Bem. Fico por aqui. Ainda estou às voltas com a leitura desse excelente livro de bolso, que, no curso do estudo filosófico nele contido, faz referências e citações de grandes pensadores, que contribuíram para questionar o ser humano, que é o fundamento e a essência da vida neste planeta, repleto de contradições, de Caim e Abel.

Volto à questão acima: o momento em que estamos a viver está russo ou ruço? Um tanto de um e um tanto do outro. Se ruço, é porque as coisas andam complicadas. Ou seja: na linguagem do criador de Tia Zulmira e do primo Altamirando, a situação está mais para urubu do que para colibri. Mas, se russo, não há necessidade de tanta meditação, basta sentarmos, inquietamente, ante o telão de nossos tv’s, lá estão os russos com todas as parafernálias destrutivas, matando e destruindo a Ucrânia, e as mulheres, as crianças e a população civil ucranianas. Seguem a insensatez da violência do mais forte, a espezinhar o mais fraco. Assim foi no Vietnã, quando o todo poderoso Estados Unidos da América do Norte assassinou, com os mesmos requintes de crueldade, as mulheres, as criança e os civis vietnamitas, cujos soldados, como está a ocorrer na Ucrânia, resistiram ao poderia destrutivo do Tio Sam. Volto à frase inicial: “Há coisas que não desaparecem; dentre elas está a violência.”  

E essa violência vem se projetando de várias formas. No Brasil, a nossa gentil pátria amada, a pouco e pouco, está-se eliminando o direito trabalhista, uma conquista de anos e anos de luta da classe trabalhadora. Tenho informação de que o nosso sistema de fiscalização está praticamente falido, além de que há empresas e empresários que exigem do seu empregado uma jornada de trabalho, na qual o início é ainda no raiar do dia e fim, sabe Deus quando. Isso me lembra quando, ainda garoto, via empregadas de fábrica – Santa Isabel, Cânhamo, Santa Amélia e outras – que, de madrugada, saíam às pressas de suas rústicas casas, e só voltavam pela noite adentro. Sem jornada de trabalho, sem horas extras. Ou era assim, ou demissão. Em decorrência, fome e desamparo aos filhos e filhas. Enquanto isso, os proprietários dessas fábricas viviam como príncipes, às custas do suor escravizado dos seus empregados. Era assim. A justiça do trabalho ainda incipiente, muito pouco podia fazer. Eu, bem cedo, ainda com quatorze ou quinze anos, já era operário, trabalhando muitas vezes durante a noite, até o dia amanhecer.

Não registro esses fatos por mim, mas por aqueles que precisam ter os seus direitos reconhecidos e protegidos. De que adianta o capitalista ficar mais rico, e cada vez mais rico, como ocorre com as instituições financeiras, que não têm mais compromisso social sequer com o emprego, e o trabalhador ficar cada vez mais empobrecido?

O autor, acima mencionado, se refere à violência da negatividade e à violência da positividade, sendo que esta é exercida de forma paradoxal, porquanto corrói as estruturas sociais e impõe a sua força, sem limites, acobertada pelo conformismo de quem dela pensa que se beneficia. Foi o que ocorreu com Hitler, na Alemanha nazista, que chegou ao poder com o apoio dos interesses de todas as forças econômicas. E, depois, levou o mundo a uma catástrofe de destruição. Num primeiro momento de sua ascensão, prevaleceu a violência consentida pelos interesses religiosos, econômicos, ideológicos, e, logo em seguida, a SS, a Gestapo, o holocausto, com a participação maciça, ou de boa parcela, de médicos, que estabeleciam quem ia ou não para o crematório.

Em nossa pátria amada, tenho tido conhecimento de que, silenciosamente, numa prática de violência contra as nossas instituições, sobretudo as Forças Armadas, os militares estão ocupando mais de vinte mil postos civis, contribuindo para essa situação caótica que estamos a viver. Até compra de Viagra para o Exército brasileiro foi feita. Talvez os nossos garbosos militares precisem desse medicamento afrodisíaco, para dar-lhes mais ânimo nos entreveros de alguma batalha que esteja na iminência de acontecer. Foram 35 mil comprimidos adquiridos, para uso de nossos heróis, que, na guerra do Paraguaio, seguiram a receita do paraibano Jackson do Pandeiro, que recomendava apenas tutano.De fato, a coisa anda ruça!

* Membro da AML e AIL
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