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19/03/2022 às 00h00min - Atualizada em 19/03/2022 às 00h00min

“ BUTIQUIM DE FESTA ”

CLEMENTE VIEGAS

CLEMENTE VIEGAS

O Doutor CLEMENTE VIEGAS é advogado, jornalista, cronista e... interpreta e questiona o social.

 
Lembro com muita saudade, daquele velho tempo por aqui, anos 1980 e mais adiante, e eu vivia incessante e intensivo à procura de um pretexto para escrever um texto. Eu tinha na época o PROGRAMA RÁDIO LIVRE, na Rádio Imperatriz, e nele a crônica diária O DRAMA NOSSO DE CADA DIA, que era considerado o carro-chefe do horário. Escrever um texto diário, na época, tornou-se em mim um dever, uma compulsão. Era, ao que posso considerar, um texto mais simples. Hoje, novamente, essa “compulsão volta a atacar”. E então em tudo eu vivo buscando um pretexto para escrever um texto. Texto/s que escrevo para o Rádio A/M, na capital. Foi assim que me lembrei dos antigos BUTIQUINS DE FESTA, no interior. E então, na compulsão, vamos nessa...

“BUTIQUIM DE FESTA” era o pequenino balcão comercial, então existentes nas festas, no interior. Fosse em festa de baile, boiadas, Baile de São Gonçalo, Festa da Conceição. Festa de São Sebastião. Tinha que ter sempre o BUTIQUIM. Nas festas de baile, tipo aquelas tocadas por Zé do Bule, ao violino a noite inteira. À beira do terreiro, levantava-se uma pequena cobertura em palhas verdes, Ali servia-se a cachaça, a meladinha, o Cinzano, o Martini, o bombom Piper, o cigarro. Também um guaraná. E, só mais tarde, uma cerveja que era pouca e misturada a um gelo, na palha de arroz. Mais nada. Toda a mercadoria do BUTIQUIM dava um jacá. E mais nada!

Mais nada não! O BUTIQUIM tinha também um objetivo social, cavalheiro e digno da maior honradez. É que muitos daqueles rapazes e senhores que chegavam à festa, num gesto de cordialidade, decência, e de extremo respeito. Logo puxavam da cintura as suas armas – fossem revólver, Mauser, pistola ou faca e entregavam ao HOMEM DO BUTIQUIM – este que exercia uma função de plena confiança e responsabilidade perante o anfitrião, o dono da festa.

O lado bom desse momento era justo quando a entrega da arma ao ENCARREGADO DO BUTIQUIM dava-se à presença do dono da festa - o dono da casa.  Era um indicativo de bom sujeito, de bom rapaz. De boa pessoa. Indicativo de quem era de paz, de quem não era de encrenca nem de confusão. Amas essas, muitas delas, de puro enfeite e exibição. E ficavam ali todos regozijados e felizes. Entregar uma arma direto ao HOMEM DO BUTIQUIM, também se entregava mas isso não tinha graça. Bom mesmo era que a entrega da arma fosse na presença do dono da festa. Era a honra para a casa!

E então o HOMEM DO BUTIQUIM ia pegando arma por arma e colocando-as a um canto, junto à paredezinha rala, de palha, naquele cubículo de metro e meio por metro e meio. Até um moleque pelo lado de fora, poderia meter a mão e puxar uma arma por trás, fosse o caso. E então ficavam as armas: facas, revólveres, mauser’s, pistolas, facas - todas amontoada, sobre ou dentro de um saco, ao chão. Ao final da festa o dono da festa ainda que no prejuízo se orgulhava em peito cheio: “minha festa não deu briga”.

A festa naquela época, terminava às seis da manhã. Desde às cinco porém, todos tresnoitados e na ressaca, rescendendo a grogue e a loção, iam pedir de volta as suas armas. É esta? Perguntava o HOMEM DO BUTIQUIM. - Não, é aquela. - Não aquela outra. E assim era essa “mistureba” que confundia e demorava na entrega. Mas ao fim do baile, cada um já havia pego suas armas de volta. Muitas delas, creiam,  com as balas, tais como foram entregues! Era assim naqueles BUTIQUINS DE FESTA! Hoje eu me lembro desse velho tempo e escrevo para o Rádio/AM, em “PÁGINA DE SAUDADE”, este texto que adaptei para estes... CAMINHOS POR ONDE ANDEI.

* Viegas questiona o social.
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