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26/02/2022 às 00h00min - Atualizada em 26/02/2022 às 00h00min

AINDA SOBRE O CHÁ

(A FÉ E O PAU DA BARCA)

CLEMENTE VIEGAS

CLEMENTE VIEGAS

O Doutor CLEMENTE VIEGAS é advogado, jornalista, cronista e... interpreta e questiona o social.

 
O Senhor meu pai e quando de suas ondas bem humoradas, família ainda pequena, eu o primeiro aos quatro anos, ele costumava ainda no início da noite, ao prenúncio do caminho da rede em contar suas estórias que a gente pedia. Uma delas que eu ainda guardo na memória e sei de  cor.  Ele contava e eu dizia: Conta mais pai!, conta mais!. Raramente só mais outra. E ao final sempre dizia: “já chega”. E a próxima viria um mês depois, quem sabe, talvez.

Aos cinco anos quando entrei na escolar do sertão e da palmatória, não me lembro ter mais ouvido o meu pai em seus contos. Hoje, revendo esse passado, eu imagino que o meu pai, por vezes criava, inventava aquelas estórias. Vamos a uma agora  que guardo na memória e sei de cor. Dizia o meu pai que quando terminou o DILÚVIO, Noé recolheu sua barca no quintal de sua casa – (que só agora eu vejo que era no Monte Ararate, na Região de Anatólia, na Turquia e onde Noé, viveu durante 350 anos. Mas é certo que a isso o meu pai não se referia.

Reflito agora que, naquela época de um povo de costumes nômades nômade que vivia caminhando, peregrinando, ora pelo deserto, ora atrevessando os mares ,ora pelas montanhas, em romaria e peregrinações, foram então bater na morada de Noé, onde passaram a admirar aquela grandiloquente embarcação que era a sua arca,  construída sob régias medidas ditadas pelo Senhor, na qual durante o Dilúvio, conduziu um casal de todos os animais então existentes sobre a face da terra. (Interpretação livre da Bíblia em  Gêneis cap. 6 vers. 13 e cap. 9 vers. 19).

Dizia o meu pai que as pessoas, então, passaram a pedir a Noé pequenos pedados de madeira da arca (amostras), para levá-los como lembrança e como prova da história. Contudo, logo se disseminou mundo a fora que tais resíduos prestavam-se a CHÁS que, indistintamente,  curavam todos os tipos de malefícios e doenças. E assim de pedaço em pedaço, de resíduo em resíduo para aquelas romarias, eis que a BARCA DE NOÉ, LIQUIDOU-SE. Acabou. Não tinha mais nada.

Certo dia, porém, chega ali um homem, transtornado, que pediu a Noé um pequeno pedaço do PAU DA BARCA, pois que sua mulher encontrava-se muito doente e que um CHÁ daquela madeira seria a solução ao seu sofrimento. Noé respondeu então que não mais dispunha de absolutamente nada de sua arca, pois que de tantos pedidos, enfim, não restava mais nada. O homem não se deu por vencido e implorou a Noé que fosse ao seu quintal, que procurasse, que poderia encontrar um pequeno pedaço, por pequeno que fosse.

Noé vendo aquela aflição foi ao seu quintal e, como da arca não havia mais nada, trouxe-lhe um pequeno pedaço de uma madeira qualquer e entregou-a ao homem. Dias depois esse mesmo homem volta a Noé: “Noé eu vim aqui te agradecer. A minha mulher tomou um CHÁ e... santo remédio! Está boazinha!   E quando o homem foi embora, Noé exclamou: “MAIS VALE A FÉ DO QUE O PAU DA BARCA!”.

Eu, aos quatro anos, ouvia solene naquele princípio de noite, esse relato do meu pai. Era como se estivesse vendo a cena: o dilúvio acabado, a arca derreada, as romarias das pessoas ao pedido e à cata do pau da barca. E aquele outro pedindo ainda que um “pedacinho” para um chá para a sua mulher. Via também, Noé encontrando uma suposta solução. Via o homem voltar e agradecer pela cura de sua mulher; via também Noé exclamando: MAIS VALE A FÉ DO QUE O PAU DA BARCA! Hoje 72 anos depois, acreditem, eu ainda ouço e vejo nesse CHÁ, a exclamação de Noé: *MAIS VALE A FÉ DO QUE O PAU DA BARCA!!!*

* Viegas é bicho do mato e questiona o social.
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